Quando o sentimento de vislumbre toma toda a arquibancada ao se acompanhar a apresentação de um casal de mestre-sala e porta-bandeira, o tempo do mundo parece ficar suspenso e passa a ser orientado apenas pelos movimentos leves dessa dupla, seus sorrisos irradiantes e pelo desfraldar do manto sagrado da escola de samba em desfile. Feitos flor e beija-flor, o par altivo exalta o pavilhão com graciosidade e com zelo imenso, pois sabe que carregam, representados naquele símbolo, uma vasta rede de pessoas, memórias, sacrifícios, suor e alegrias. E, se tal espetáculo é possível pelos doces rodeios da porta-bandeira e pelos incríveis jogos de perna do mestre-sala, é ainda mais assegurado pelo trabalho atento de guardiãs e guardiões que os apoiam desde muito antes da apoteose e os apresentam, entusiasmados, ao público. Viviane Martins Ramos, ou a nossa querida apresentadora de casais Vivi Martins, é um desses exemplos de que, por trás de uma inesquecível passagem na avenida, há um imenso caminho trilhado que requer estudo, esforço, dedicação e, claro, muito amor à arte do bailado.

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Imagem: Antonio Vieira

Filha de pai músico e de mãe que a levava a bailes de fantasia e a acompanhava, maravilhada, as transmissões dos desfiles pela televisão, Vivi morou ao lado da quadra da Boêmios de Inhaúma, no Engenho da Rainha, zona norte do Rio de Janeiro. A arte e o carnaval já faziam parte de seu cotidiano.

Mas foi apenas aos 23 anos, com o ingresso na Companhia Folclórica do Rio, ligada à Universidade Federal (UFRJ), que conheceu o Projeto do lorde Manoel Dionísio, verdadeiro celeiro de bambas, onde acabou se encantando com a dança. Aprendeu as técnicas e todo o significado mágico do pavilhão “na fonte” com baluartes como Mestre Delegado, Tia Soninha, Tia Titia, Carlinhos Brilhante, Tia Irene, Mestre Adilson, Mestre Jamelão, entre outros eternos.

E, como conversa de sambista é samba, Vivi Martins vem realizando muitos trabalhos práticos dentro do universo dos casais, colocando a mão na massa pra valer. Como apresentadora de casais, que é a função de dar assistência aos dançantes e os anunciar ao público, Vivi tem um currículo estrelado. Unidos de Padre Miguel (2017), São Clemente, Renascer, Rocinha e Novo Império, de Vitória/ES (2018), Cubango, Renascer de Jacarepaguá (2019) e Portela (2020) são agremiações que tiveram o privilégio de contar com seu precioso olhar. Sim, não se engane, esta lista pode e deve estar incompleta, já que Vivi é uma máquina de produzir grandes espetáculos. Ô sorte dos casais que a têm por perto!

A alta procura por todo esse profissionalismo e por toda dedicação ao bailado fez com que Vivi Martins precisasse pensar uma forma de atender a cada pessoa interessada. Foi assim, então, que surgiu o Projeto Minueto do Samba, iniciativa que chega ao seu sexto ano de atividade em 2021. Ao lado do mestre Carlinhos Brilhante, Vivi recebe, no Méier, zona norte da capital, crianças, adolescentes e adultos iniciantes na dança. É um acompanhamento muito atento a cada “história corporal” que está sendo escrita, que requer um acolhimento tão carinhoso que se assemelha a uma família.

Vivi Martins, assim, vai deixando sua marca durante todo o processo que envolve a arte do “balé das avenidas”. Associa-se a pensadoras e pensadores do carnaval para escrever riquíssimos trabalhos, estuda, planeja e executa planos de ensino e aprendizagem para o aperfeiçoamento dos dançantes e dá auxílio primoroso na preparação dos casais oficiais, os envolvendo em seus braços de cuidado e ternura.

Texto: Felipe Gabriel Oliveira, antropólogo e mestre-sala da Unidos do Parque Aeroporto, de Taubaté-SP

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