“Quase centenária, uma nação incorporada”. Esses versos do samba 2026 podem resumir quase o todo de mais um ensaio da Verde e Rosa na Visconde de Niterói. E o “quase o todo” só existe mesmo porque seria injusto não falar que muito disso é resultado de trabalho e técnica, principalmente, na parte musical. Com uma obra melhor que a dos anos anteriores, a Mangueira, que há alguns anos já faz um trabalho muito forte aliando carro de som, direção musical e bateria, pode, este ano, testar ainda mais os seus limites musicais. Isso, mais uma vez, se refletiu na escola como um todo. Se a Mangueira já é uma escola que canta normalmente, agora ela canta ainda mais, com mais vontade, mais alegria e da forma correta. O componente abrilhanta o samba, e o samba abrilhanta o componente. Uma grande troca.
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No mais, a escola também passou bem em outros quesitos: muita garra, conceito e a intensidade de sempre na comissão de frente. Para o casal, o mesmo, adicionado de uma grande dose de postura, doçura e dança. Harmonia forte, como falado, tanto no canto como no carro de som, e a bateria sendo fundamental para isso.

O diretor de carnaval Dudu Azevedo avaliou esse período de trabalho com minidesfiles e ensaios de rua, que agora só voltam no dia 4 de janeiro.
“Como a gente costuma falar aqui, a gente vem buscando o melhor. E é o melhor do samba, o melhor da evolução da escola. Os ensaios cada vez mais correspondem ao que a gente vem conversando durante a semana. Mas estamos subindo a ladeira, estamos trabalhando para que a Mangueira chegue bem aos ensaios técnicos e para um grande desfile”, explica o profissional.

Ao ser questionado sobre em que ponto a Mangueira ainda precisa ter maior atenção, Dudu não especificou um destaque, mas afirmou que o seu time de carnaval avalia tudo a cada final de ensaio e procura sempre trabalhar aquilo que ainda pode ser melhorado.
“Todo ensaio, cada vez que a gente bate o papo na semana, tem algo para corrigir. Tudo está sendo olhado, tudo está sendo ensaiado. Estamos ensaiando, estamos bem. Tudo que a gente precisa está sendo bem correspondido. A resposta tem sido boa: do samba, da bateria, da comunidade, da evolução, e cada vez a gente acerta mais um pouquinho”, finaliza o diretor.
Em 2026, com o enredo “Mestre Sacaca do Encanto Tucuju – O Guardião da Amazônia Negra”, a Mangueira vai encerrar a primeira noite de desfiles do Grupo Especial.
COMISSÃO DE FRENTE

Comandados pelos coreógrafos Karina Dias e Lucas Maciel, a comissão de frente da Verde e Rosa trouxe para o ensaio, mesmo sem nenhum tipo de apetrecho ou fantasia, uma atmosfera xamânica pela intensidade de seus movimentos e pela aura de sua parte gestual. A coreografia de deslocamento era bastante intensa, com os componentes trocando de lugares na falange que avançava, ora com movimentos mais doces, ora com passos mais marcados, com uma dança mais indígena em alguns momentos.

Na coreografia para os “módulos”, o grupo optou por marcar e pontuar alguns trechos do samba, como o início, em “na magia do meu tambor”, em que simulavam as batidas no instrumento, ou em “finquei minha raiz”, quando abaixavam como se tocassem a raiz propriamente dita. Apesar de a coreografia do ensaio não ter nenhum grande ápice, os componentes mostraram muita sincronia, intensidade, até com alguns saltos, e técnica. Uma apresentação que prendia o público, no padrão que a Mangueira vem trazendo nos últimos anos, com destaque.
MESTRE-SALA E PORTA-BANDEIRA
É muito bom ver esse casal dançar. Aos gritos de “Furacão”, a dupla mostrou seu estilo muito próprio, que representa muito do que é o casal de mestre-sala e porta-bandeira. Com uma herança enorme e um grande legado nas costas, Matheus Olivério dança muito como se imagina para um cargo que, nesta escola, teve o mestre Delegado como expoente. De forma a riscar o chão com muita elegância, Matheus se destacava sem ofuscar o pavilhão, muito bem empunhado por Cintya Santos.

Ela é, de verdade, um furacão, mas com classe, sabendo trazer também a delicadeza para dançar. A dupla optou por uma coreografia que não pontuava tanto a letra do samba, mas que pudesse extrair o melhor do estilo de cada um. Com os fortes giros de Cintya, movimentos muito bem cravados com a bandeira e com a dupla se procurando bastante. O único ponto a se colocar foi no segundo módulo, quando, por causa do vento, Matheus já pegou a bandeira um pouco menos aberta, mas nada que tenha comprometido a belíssima apresentação.
HARMONIA E SAMBA-ENREDO
Grandes destaques, mais uma vez, do ensaio da Mangueira: um completou o outro. A escolha por esta obra mostra até a retomada de um passado recente, do início deste século, quando a escola trazia sambas melodiosos, que encaixavam bem com a bateria e que contavam o enredo, trazendo ao mesmo tempo uma exaltação à escola.
Musicalmente, a obra permitiu que a Mangueira se desenvolvesse bastante, usando todas as suas possibilidades com bateria, carro de som, cordas e, obviamente, o povo, todos bastante entrosados. Tudo parece fazer muito sentido e trabalhar para o todo. Com uma cabeça bem melodiosa, mas com frases fortes como “Mangueira quase centenária, uma nação incorporada”, o samba parece estar muito à vontade na boca do folião, até pelo excelente andamento, que não o arrasta, mas consegue tirar toda a sua métrica e melodia.

Mesmo o diferente refrão do meio, sem um bis clássico, com a repetição direta dos versos e não do refrão como um todo, é um ponto alto da obra, desaguando em outro trecho muito forte em “Salve o curandeiro, doutor da floresta”. Na segunda, a escola mantém o forte tom melodioso até “Yá Benedita de Oliveira”, quando retoma a sua exaltação. Mesmo não sendo um refrão estrondoso, “a magia do meu tambor” já caiu na boca da comunidade.
O canto da escola foi muito forte durante todo o ensaio e por toda a escola. Conseguiu-se ouvir, por exemplo, o canto forte na comissão de frente. Outras alas, como baianas, passistas e velha guarda, também cantavam de maneira uniforme com as demais alas da comunidade. Ótimo ensaio em harmonia e samba.

EVOLUÇÃO
A evolução da Mangueira ocorreu com fluidez e espontaneidade, com muita alegria por parte de todos os componentes. No sentido geral, organizada, mas com alguns pontos a se prestar atenção. Principalmente em traços que normalmente já são mais delicados no desfile, em deslocamentos importantes, como na ala que vem logo em seguida ao primeiro casal.

Quando a dupla entrou em suas apresentações nos módulos, em mais de uma oportunidade a ala demorou um pouquinho para se deslocar e preencher o espaço. Também no avanço das musas após as alas avançarem, principalmente as que vêm à frente de alegorias ou tripés, pensando no desfile, o elemento terá um preenchimento territorial muito maior e vai demorar mais para se deslocar. Outro ponto é a velocidade de deslocamento: em alguns momentos, a escola deu a impressão de que poderia se deslocar de forma mais cadenciada. Detalhes aos quais a Mangueira certamente está atenta e tem tempo para passar o pente-fino.
OUTROS DESTAQUES
A “Tem Que Respeitar Meu Tamborim” foi um show do início ao fim do ensaio, já no esquenta, aliás. Destaque para a musicalidade e a originalidade dos naipes de xequerês e timbaques. A rainha Evelyn Bastos, mais uma vez, deu uma aula de samba no pé e simpatia, sempre rodeada de crianças da comunidade; afinal, ela é um grande ícone e inspiração.

Diversas alas trouxeram elementos de mão, como bastões e bexigas. No esquenta, Dowglas Diniz e o carro de som relembraram o “Tem Capoeira”.









