Marta nordestina, mata o preconceito e mostra seu talento: o dom de jogar e vencer no futebol
Nome do enredo: Marta do Brasil – Chorar no começo para sorrir no fim
Nome do carnavalesco: Jorge Caribé
O Grêmio Recreativo Escola de Samba Inocentes de Belford Roxo traz para o carnaval de 2020 um enredo em homenagem a atleta Marta Vieira da Silva, a Marta. Em sua proposta a agremiação da baixada fluminense abordará mais uma de nossas notáveis nordestinas. Não posso deixar de mensurar que esta narrativa fala de lutas. Muitas.
A primeira luta é de resistir na infância sofrida. Vinda de Dois Riachos cidade do interior do Alagoas, fronteira com Pernambuco, pobre e sofredora como a maior parte do nosso povo. Dona Teresa, a mãe, viu através de toda àquela poeira do chão de barro do sertão sua menina jogar bola como ninguém, ali já nascia a primeira quebra de paradigma dessa mulher, uma menina jogando bola entre meninos no fim dos anos 1980.
A segunda luta é contra o preconceito de gênero. A menina Marta nos leva a reflexão sobre o machismo existente dentro do futebol, um esporte que desde sua origem, possui um espaço sobressaído masculino. Onde as ordens embutidas em valores machistas ultrapassam não somente o lado esportivo, mas também o sociocultural.
O cenário que a homenageada ainda criança encontra ao desbravar uma área totalmente dominada por homens, mostra o quanto o esporte torna tácitas questões que muitas vezes estão no subconsciente dos brasileiros onde a mulher é visualizada como frágil, delicada, submissa, fraca, fútil dentre tantos adjetivos que irão permear a vida das mulheres que ousam lançar-se em universos genuinamente masculinos.
Marta chega à adolescência apaixonada pelo CSA (Centro Sportivo Alagoano), clube de coração e de sua juventude, lá ela inicia sua carreira, mas o baixíssimo investimento e interesse dos líderes futebolísticos brasileiros a levam até a Suécia país que a acolhe como filha, a valoriza, naturaliza e apresenta ao mundo.
O preconceito e falta de compreensão de que o futebol é para todos, leva uma filha deste chão “trocar” sua nação por outra que reconhece e valoriza o futebol feminino. A jovem Marta nos traz a reflexão da nação inóspita que o Brasil é para mulheres que se atrevem, e ainda apresenta uma ditadura de padronização não explicitamente declarada sobre o ser homem e o ser mulher.
Tal padronização nos apresenta outro paradigma de luta da homenageada que é ter sua orientação sexual diretamente vinculada pelas pessoas como fator relevante de seu sucesso ou fracasso profissional.
Marta a rainha do futebol, de batom, a jogadora que faz questão de mostrar que o feminino pode estar no gramado, de cabeça erguida, levando nas suas costas uma nação apaixonada em vê-la jogar, seis prêmios de melhor jogadora do mundo sendo cinco consecutivos, (marca jamais alcançada por um homem), e uma população inteira de mulheres que lutam dia-a-dia. Uma verdadeira estrela do futebol.
Marta escancara a porta para as meninas do Brasil e do mundo entrarem e se apoderarem do querer ser e fazer, não só no futebol, mas em todos os campos da vida. A sua luta contra o preconceito à mulher, por direitos iguais, salários iguais, valorização do futebol feminino e das mulheres foram sintetizadas em sua frase após a eliminação da seleção na copa do mundo de 2019:
“Não vai ter uma Formiga para sempre, uma Marta, uma Cristiane. Pensem nisso, valorizem mais. Chorem no começo para sorrir no fim” (Entrevista da jogadora para a Rede Globo – 23/06/2019).
Mais uma vez, nossa estrela nos leva a reflexão de que a luta das mulheres não pode parar e por mais que hoje possa estar doído e talvez não pareça haver uma saída, que as meninas não desistam, chorem no começo para sorrir no fim. Essa frase sintetiza muito o momento que o carnaval está passando, especialmente as escolas da série A. Assim como a homenageada Marta, superou tantos obstáculos até a sua consagração, que o carnaval e a Inocentes possam superar todos os obstáculos deste ano vindouro.
Inocentes de Belford Roxo, parabéns por homenagear em vida um símbolo feminista que é motivo de grande orgulho para todos os brasileiros. Força, garra, persistência e união. Chorem no começo para sorrir no fim! Sorte e bom carnaval!
Autor: Lucas Miranda
Administração/UFF
Membro efetivo do OBCAR/UFRJ
Leitor orientador: Tiago Freitas
Doutorando em História da Arte/UERJ e Doutorando em Linguística/UFRJ
Instagram: @observatoriodecarnaval_ufrj