Cubango: Luiz Gama – Um grito de liberdade e de igualdade no Carnaval 2020

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Enredo: A Voz da Liberdade
Carnavalescos: Raphael Torres e Alexandre Rangel

Para o carnaval de 2020, a verde e branco de Niterói terá como enredo o patrono da
abolição Luiz Gonzaga Pinto da Gama. Negro, autodidata, intelectual, poeta, jornalista e
advogado, Luiz Gama foi um dos importantes personagens da história do Brasil dos quais pouco ou nada ouvimos falar, mas que a agremiação Acadêmicos do Cubango nos apresentará em seu desfile. A escola exibirá na avenida a vida de Gama a partir suas raízes africanas, por meio de sua mãe, Luiza Mahin, relacionando-o com as insurreições e o trabalho escravo até chegar a sua participação no Movimento Abolicionista de luta pela liberdade dos negros escravizados.

Apesar de Gama ser uma personalidade histórica que sofreu, através do tempo, com a
questão do apagamento histórico dentro do que conhecemos como História Oficial − tal qual sua mãe e muitos dos outros personagens negros e indígenas da história do Brasil −, o texto da sinopse é similar ao tipo de texto historiográfico. Isto porque os carnavalescos Raphael Torres e Alexandre Rangel, para apresentar o enredo da escola, fizeram uso de acontecimentos históricos, estudados e datados, que foram parte da realidade do período em que Luiz Gama viveu, os quais ele mesmo presenciou ou participou. Como, por exemplo, a Revolta dos Malês, ocorrida na Bahia em 1835, ou a questão do uso de mão-de-obra escrava em minas de ouro e fazendas de café, algodão e cana-de-açúcar. Como, também, o uso da carta autobiográfica no início do texto, que o homenageado escreveu para seu amigo, também jornalista, Lúcio de Mendonça.

Podemos encarar isso como uma forma de inserir o personagem na nossa história oficial,
visto que a existência de personagens como ele é sempre questionada por falta de dados precisos e registros oficiais, presentes nos documentos estudados por historiadores. Porém, o que devemos levar em conta com relação a isso é o fato de que poucos eram os negros que possuíam documentação, como certidão de nascimento ou de batismo, o que dificulta esse tipo de validação. Um bom exemplo é o caso da própria Luiza Mahin, mãe de Luiz Gama, cuja existência é atestada por meio da carta, mencionada anteriormente, em que ele fala sobre a vida da mãe. Por isso é de grande importância e relevância que personagens como Luiz Gama tenham sua história contada, para que sempre nos lembremos de sua existência e do que fizeram. Para que eles saiam da posição de marginalizados para a de heróis da nossa história tanto quanto os heróis dos livros didáticos.

E Luiz Gama pode ser visto, de fato, como um herói. Pois ele lutou verdadeiramente
pela liberdade de seus iguais, de uma forma que poucos negros naquela época poderiam fazer. Ele atuou como advogado, mesmo que não tenha se formado em advocacia – ou seja, um rábula −, defendendo inúmeros escravizados em causas judiciais. Uma relação interessante que podemos fazer entre a proposta do enredo, a partir da pessoa Luiz Gama, e alguma característica da agremiação é o fato da luta pela liberdade dos escravizados. Pois haveria indícios, a partir da história oral, de que no bairro sede da agremiação existiu um quilombo, fato mencionado no desfile de 2015, ou seja, um lugar de liberdade e resistência, o que nos remete a tudo pelo que Luiz Gama lutou durante sua vida.

Vemos também no texto da sinopse que a escola dará significativa importância para uma
possível relação entre quem foi Luiza Mahin e sua influência na vida e na personalidade de seu filho. Assim como, também, nas questões escravistas, pois Gama, além de filho de escrava foi ele mesmo vendido como escravo por seu próprio pai. É possível que vejamos na avenida representações de sua ancestralidade africana de realeza, a casa em que Luiz viveu na Bahia, os movimentos revoltosos em prol do povo negro e da abolição, locais de trabalho escravo e a atuação de Luiz Gama enquanto rábula e no movimento abolicionista. Poderemos ver também alguma relação entre sua luta pela liberdade e por direitos do povo negro e as condições atuais dos negros dentro da nossa sociedade.

Ressaltar a imagem de Luiz Gama no carnaval é falar sobre um negro, ex-escravo que
em pleno Brasil Império conseguiu ser um intelectual e influente jornalista. Falar de Luiz Gama é falar de luta, por liberdade, por direitos, por dignidade do povo negro, coisas que nos tempos em que vivemos estão cada vez mais postas em cheque dentro da sociedade brasileira. Falar de Luiz Gama é falar de esperança para tantos rostos semelhantes ao seu dentro das comunidades das escolas de samba, esperança também para que tenhamos uma sociedade melhor, mais igualitária em questões sociais e raciais. Falar de Luiz Gama é negar o apagamento de figuras de negros importantes na história do Brasil, que devem ser sempre lembrados e exaltados como heróis que foram.

Que o patrono da abolição faça do carnaval da Acadêmicos do Cubango um desfile
brilhante, como seu homenageado, e LIVRE de preconceitos!

Autora: Raphaela Vaz – [email protected]
Graduanda em História – UFRJ
Membro efetivo do OBCAR
Leitor orientador: Max Oliveira
Doutorando em História – PPHR/UFRRJ
Membro efetivo do OBCAR
Instagram: @observatoriodecarnaval_ufrj

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