O desenho do tamborim de uma escola é parte incontestável da assinatura rítmica de uma bateria. Seja ouvindo áudios ao vivo ou assistindo gravações de desfiles é plenamente viável perceber essa sonoridade de forma destacada, por causa do timbre agudo. Está inserida em nossa cultura musical ouvirmos a subida curta dos tamborins da Beija-Flor após a virada do refrão principal, ou mesmo aquele telecoteco genuinamente mangueirense tocado de forma peculiar num trecho da segunda do samba, isso sem contar as subidas atrasadas do naipe da Mocidade Independente, entre tantas outras inegáveis batidas ligadas ao DNA musical das agremiações. Toda ala de tamborim, portanto, tem uma missão no que tange a preservação de determinadas características musicais, bem como na propagação da cultura de desenhos rítmicos.
É vital mencionar que o tamborim é um naipe de apoio. Uma ala que complementa com coletividade e uma peça bastante aguda, acompanhando o ritmo da bateria e consolidando seu desenho rítmico através da melodia do samba. Serve, inclusive, de referência para os demais naipes. Em qual trecho do samba está? A resposta normalmente se encontra facilmente ouvindo com atenção as frases musicais dos tamborins.
Exatamente por servir como referência é que o tamborim ganha uma projeção dentro das escolas que extrapola a importância rítmica para a bateria. Pois essa referência também é notada, assimilada e constantemente utilizada por componentes durante os ensaios. Um desenho rítmico de tamborim influencia, sobretudo, no jeito como a agremiação irá evoluir, dançar e de certa forma até cantar o samba. Importante citar a eficácia inestimável envolvendo o toque do carreteiro (aquele pacaticapá frenético e constante), pois o mesmo impulsiona desfilantes em aspectos primordiais de um cortejo, como canto e dança. Quanto mais simples forem os desenhos, mais o componente irá absorver musicalmente e atrelar a batida do naipe de tamborins à sua cultura performática de ensaios.
Uma questão específica a ser contornada é que a evolução técnica dos ritmistas de tamborim tem provocado desenhos cada vez mais complexos e bem elaborados, com dificuldade de execução praticamente crescente. Inúmeros são os momentos, em diversas batidas de tamborim, que um grande volume de informação rítmica é colocado em trechos musicais que mal cabem. Essa falta de integração musical, por vezes, ocasiona desenhos rítmicos executados de modo mecânico e não orgânico, pois o ritmista irá fazer a batida, mas sem sentir e se entregar de forma apropriada a energia da música. É necessário um cuidado ainda maior quando inserir floreios no desenho de tamborim, pois os mesmos exigem capacidade técnica unida a alto poder de concentração, além de andamento confortável, para garantir a execução mais limpa e natural possível.
A fluidez musical é imprescindível como norte para criação de uma batida de tamborim. É importante buscar soluções intuitivas ao criar o desenho rítmico. Deixar a melodia do samba guiar a convenção acaba sendo a maneira mais ritmicamente inspirada de sentir a música, além de buscar que os ritmistas responsáveis por tocar o desenho façam isso da forma mais orgânica e espontânea possível. Indica coerência possuir um desenho alinhado com a capacidade técnica de toda ala, evitando que os ritmistas desfilem presos ou com medo de executarem determinados trechos. Quanto mais o ambiente da ala for leve e o ritmista desfilar solto melhor será para a mais perfeita execução da batida, garantindo ainda por cima uma entrega energética, além de rítmica. Fazer ritmo é bom demais, mas poder tocar curtindo o desfile certamente é ainda mais.
Talvez exatamente pela questão envolvendo a assinatura musical é que algumas alas tenham buscado um caminho de crescimento rítmico constante. Mas já estamos num ponto que deixamos de refletir sobre as bases fundamentais que sempre nortearam o toque dos tamborins dentro das baterias cariocas, na criação de suas convenções. É urgente que deixem o ego de lado e busquem soluções musicais simples e eficazes, de melhor assimilação geral, contribuindo assim ritmicamente com a bateria e animicamente com os componentes das escolas. Tamborim é naipe rítmico de complemento e a bateria responsável pela execução musical de acompanhamento a um cortejo e seus desfilantes. Mais do que nunca se faz necessário olhar para o passado com muito carinho, para avaliar se estamos de fato evoluindo ou simplesmente descaracterizando, cada vez mais, nossos ritmos.