A década de 1980 foi marcante para a história do carnaval do Rio de Janeiro. Um dos momentos mais especiais de tal decênio veio em 1984 – e isso nada tem a ver com a inauguração do Sambódromo, na então rua Marquês de Sapucaí. Em tal temporada, dissidentes da Águia de Madureira fundaram uma nova escala, batizada de Portela Tradição em homenagem à azul e branco – pouco depois renomeada para Amor e Tradição, para evitar questões judiciais; e, enfim, tendo apenas a última nomenclatura como a oficial. Logo em 1988, ela já estava no Grupo Especial – em uma ascensão meteórica, subindo de divisão em todos os desfiles desde então. Desde 2015, entretanto, a escola não conseguia retornar à Série Ouro – último pelotão com desfiles no principal palco do carnaval da Cidade Maravilhosa. Em 2025, tal tabu foi quebrado. No dia dos minidesfiles das escolas de samba da Série Ouro, realizado na Cidade do Samba, o CARNAVALESCO conversou com personagens importantes da agremiação de Campinho.
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Reconhecimento e legado
O nome do enredo da escola para o próximo carnaval já diz muito: com “Reza”, a agremiação abrirá o sábado de carnaval – 01 de março. E uma das histórias mais emocionantes que envolvem a Tradição se deu em 2022: fundador da escola e presidente da instituição até 2015, Nésio Nascimento faleceu. Quem assumiu a presidência da escola, já em 2015, foi Raphaela, filha do baluarte – e, por consequência, neta Natalino José do Nascimento, popularmente conhecido como Natal da Portela.
Antes do ocorrido, a atual presidente fez uma promessa ao pai: a Tradição voltaria a desfilar na Marquês de Sapucaí. E, ao ser perguntada sobre a emoção de ver a agremiação retornando ao Sambódromo, ela fez questão de relembrar Nésio: “É muito emocionante ver a Tradição voltando à Sapucaí sob a minha presidência. Eu costumo dizer que eu estou vivendo um sonho! Eu sou presidente há dez anos e há dez anos eu sonho com isso. E, agora, estamos concretizando isso com o minidefsfile, também iremos concretizar com o ensaio técnico; e, a cereja do bolo, vai ser o desfile oficial. Tudo isso é um legado do meu pai. Eu estou seguindo isso, dando continuidade para isso, sempre com a comunidade confiando e acreditando em mim. Para mim, é uma emoção muito grande”, comentou.
Ao ser perguntada sobre o que diria para Nésio, Raphaela foi além: “Eu falaria para o meu pai que eu já consegui um degrau do que eu prometi para ele. Agora, falta outro”, ousou.
Para 2025
Outros personagens importantes para o retorno da Tradição ao Sambódromo também falaram sobre o sentimento de estar na escola em tal momento. mestre Thiago Praxedes, comandante da “Explosão de Elite”, bateria da escola, utilizou um conceito muito conhecido do universo literário: “Primeiro que retornar para a Tradição em um momento como esse não é um sonho: é uma utopia estar aqui nesse momento. A gente está ensaiando e nos dedicando bastante. A escola tem uma potência muito grande, uma comunidade muito grande. A Tradição vai vir mostrando a verdadeira força da escola, você vai ver”, destacou.
Tradição: galeria de fotos do minidesfile na Cidade do Samba
Estreando na agremiação, o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da instituição também falou a respeito, começando com Verônica Lima: “É uma sensação muito emocionante! Hoje, estar aqui nesse minidesfile, com aquele gostinho todo especial de desfile já, é demais. E está sendo assim durante todo o ciclo carnavalesco. A escola está maravilhosa hoje, está linda, está com garra. Dá para todos verem como é que a Tradição está feliz e realizada por estar voltando à Série Ouro novamente”, afirmou a antiga comandante do pavilhão da Unidos de Bangu.
Já Jorge Vinícius, que estava na mesma instituição que a parceira, aproveitou para falar sobre desde quando ambos estão ensaiando: “A escola está fazendo um excelente trabalho. A gente já está ensaiando focado, como casal de mestre-sala e porta-bandeira, desde abril. É um trabalho muito concentrado. A escola vai passar firme, passar forte. Vamos embora e vamos com tudo!”, empolgou-se.
Questões pontuais
Desde 2023, Thiago Praxedes era mestre de bateria da Só Quem É, da Imperador do Ipiranga – tradicional escola de samba de São Paulo, atualmente no Grupo de Acesso II, terceiro grupo do carnaval paulistano. Ele não deixou de comentar a diferença entre uma cidade e outra: “Ser mestre de uma escola de samba carioca é diferente, dá um orgulho especial. É diferente para a gente por não ser desse território. Eu convivo aqui no carnaval do Rio há vinte e quatro anos. Desfilei na própria Tradição ano passado a convite do mestre Átila, tive muitos anos no Império Serrano, na Portela, com Marçalzinho e com Nilo, Mangueira, Vila Isabel… estar na frente de um trabalho aqui é diferente. É uma grande responsabilidade entender toda essa cultura e vivenciar isso que agora eu estou vivenciando de fato. A gente está tateando isso. E, para mim, eu acho que eu estou mais aprendendo com eles do que eles comigo, mas está sendo uma experiência maravilhosa”, afirmou.
Uma das principais questões envolvendo a Tradição atualmente é o local de ensaio. A antiga quadra da escola abriga, por aluguel, a Igreja Pentecostal Tempo de Milagres (IPTM) – mas o terreno do local pertence à Prefeitura do Rio de Janeiro. Sem dar muitos detalhes sobre o imbróglio, Raphaela aproveitou para destacar o atual local de ensaio da instituição: “A gente já está ensaiando toda quinta-feira na estrada Intendente Magalhães, que é a nossa casa, é o nosso lugar. Em breve vai ter muita novidade sobre a quadra”, comentou.
Atualmente, a Tradição está ensaiando na frente da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do bairro de Campinho, tradicional reduto da instituição. Vale destacar, também, a proximidade dos dois pontos em questão: a UPA fica entre a rua Capitão Couto Menezes e a Praça dos Lavradores, enquanto a IPTM está no número 160 da Intendente Magalhães – com cerca de cento e dez metros de distância entre um e outro local.
Trabalho a mil por hora
Verônica destacou que ela e Jorge Vinícius entraram de vez na temática da agremiação: “A gente tem uma representatividade crucial dentro do enredo, algo que foi um presente muito grande para a gente. A gente procurou se conectar com as forças místicas, com as forças da natureza. A gente começou a fazer trilha, ir ao ar livre para podermos absorver a energia da natureza para a gente poder, na avenida, conseguir fazer e desenvolver, com muita alegria e maestria, o nosso bailado”, revelou.
O mestre-sala, por sinal, focou no trabalho mais técnico em relação à passarela: “Além de reza, sempre com muita reza, a gente vai trazer um pouco da nossa força e do nosso bailado. Eu e Verônica estamos com um namoro, uma força, uma união e tudo que pode existir dentro da reza”, afirmou.
Por fim, Raphaela sintetizou o que é possível esperar da Tradição para 2025: “Vocês podem esperar uma escola grande, compacta, feliz, cantando, organizada e forte candidata para o título”, prometeu.