A Colorado do Brás abriu nesta sexta-feira os desfiles do Grupo Especial de São Paulo no carnaval de 2025. No retorno da escola à elite, a técnica foi o principal destaque, com um canto da comunidade vibrante, evolução fluída e constante e bateria criativa animando todo o desfile, encerrado após 64 minutos. A Vermelho e Branco se apresentou com o enredo “Afoxé Filhos de Gandhy no ritmo da fé”, assinado pelo carnavalesco David Eslavick.
Comissão de Frente
Coreografada por Paula Gasparini, a comissão de frente da Colorado foi intitulada “Filhos da Paz, Herdeiros da Resistência: Do Porto à Eternidade” e se apresentou ao longo de 1 passagem do samba. Usando de um elemento cenográfico que simbolizou um templo indiano, o quesito começou a coreografia apresentando os estivadores do Porto de Salvador, que em meio ao árduo trabalho encontravam disposição para brincar o carnaval e fundaram o bloco Comendo Coentro, que posteriormente se tornou o Afoxé Filhos de Gandhy. A dança contou com a participação de atrizes caracterizadas como deusas indianas interagindo com os estivadores constantemente e no topo da alegoria esteve o ativista Mahatma Gandhi, que no ano seguinte da sua morte inspirou o bloco a passar a desfilar em sua homenagem com o nome “Filhos de Gandhy”, levando sua mensagem de paz para os cortejos. Houve também a presença de artistas vestidos como Clara Nunes, Caetano Veloso e Gilberto Gil, artistas que homenagearam e atuaram em prol do grupo, além de Exu, entidade do candomblé cujos rituais passaram a integrar os desfiles e levaram a conversão do bloco em um afoxé.
A coreografia foi criativa e conseguiu resumir em um único ato a proposta de mostrar a fundação do Afoxé Filhos de Gandhy. A participação de Clara, Caetano e Gil foi um show à parte, saindo do tripé que mostrava o Pelourinho nas portas do templo enquanto eles estavam fora da atuação. A interação entre os estivadores e as deusas indianas foi criativa, e o momento em que as deusas reverenciam Exu enquanto recebe o padê é outro ponto alto da apresentação. A única incoerência é que a atuação dos estivadores no início do ato começa ainda com a presença dos artistas no chão, quebrando a expectativa da revelação deles ao longo da atuação.
Mestre-sala e Porta-bandeira
O primeiro casal da Colorado, formado por Brunno Mathias e Jéssica Veríssimo, se apresentou representando o deus hindu Vishnu e sua esposa Lakshmi. A dança foi bem executada ao longo de todos os módulos, com os movimentos obrigatórios sendo bem-executados e contando com coreografias dentro da proposta das suas próprias fantasias, situada no “setor indiano” do desfile.
Enredo
O enredo da Colorado é uma homenagem ao Afoxé Filhos de Gandhy. Dividido em quatro setores, o desfile começou com uma grande referência ao ativista Mahatma Gandhi, que inspirou o antigo bloco Comendo Coentro a se converter no maior afoxé do mundo. As primeiras alas do desfile, o primeiro casal e o carro Abre-alas contaram com referências à Índia. Após esse primeiro momento, o desfile passa a narrar a história do nascimento do afoxé desde sua origem como um bloco de estivadores do Cais do Porto de Salvador, passando pela fundação do afoxé após a incorporação de ritos do candomblé e a menção aos artistas que apoiaram o bloco ao longo da história com iniciativas culturais e até através de músicas. O desfile se encerrou com uma representação do carnaval que o afoxé apresenta pelas ruas da capital da Bahia, destacando a ladeira do Pelourinho.
A leitura do enredo dentro da letra do samba gera algumas dúvidas. Há uma quantidade expressiva de referências à Índia no começo do desfile, mas não há uma menção direta ao ativista Mahatma Gandhi, apenas ao seu legado em um dos versos. A narrativa esteve mais clara na Avenida através da leitura das fantasias, mas as alegorias pouco contribuíram para uma interpretação adequada do tema proposto, com exceção da segunda que era uma referência clara ao Cais do Porto de Salvador, onde os estivadores que fundaram o bloco trabalhavam.
Alegorias
A Colorado se apresentou com um conjunto de quatro carros alegóricos que concluíram os diferentes setores do desfile. O Abre-alas foi nomeado de “A Índia de Gandhi”, e foi uma total referência ao ativista que inspirou o nome do afoxé. O segundo carro foi chamado “As Águas de Iemanjá”, baseado na região do Cais do Porto de Salvador, onde os estivadores que fundaram o bloco Comendo Coentro trabalhavam. A terceira alegoria recebeu o nome de “O Panteão dos Orixás desce pra ver o bloco passar”, representando o momento em que o bloco, já renomeado para Filhos de Gandhy, se converteram no maior afoxé do país. Por fim, a apresentação foi finalizada com o carro “O Carnaval dos Filhos de Gandhy” foi uma referência direta à famosa ladeira do Pelourinho, bairro de Salvador por onde o Afoxé Filhos de Gandhy se apresenta no carnaval baiano.
As alegorias que mais se destacaram no desfile foram as que representaram “As Águas de Iemanjá” e “O Panteão dos Orixás”. A primeira, com acabamento impecável, mostrou uma riqueza vital com a presença de componentes executando movimentos, uma inovação do carnaval dos anos 2000 que não tem sido muito vista em São Paulo nos últimos anos. A segunda retrata os Orixás do candomblé que são celebrados nos desfiles do Afoxé Filhos de Gandhy, e tinham detalhes de acabamento de alta qualidade. O Abre-alas, porém, além de ocupar um espaço na narrativa visual muito maior do que o necessário, apresentou problemas nos arcos com pombos atrás da escultura de Gandhi, onde a da esquerda mostrou estar com uma inclinação visivelmente maior que a da direita. O quarto carro, representando o Carnaval dos Filhos de Gandhy, destoou consideravelmente do nível estético das demais alegorias, além de apresentar alguns problemas de acabamento.
Fantasias
As fantasias da Colorado do Brás tiveram relação direta com os setores dos quais faziam parte. No primeiro setor, as roupas das alas e do primeiro casal ilustravam algumas das tradições indianas. O segundo setor conteve fantasias que representavam a época de fundação do Comendo Coentro, mostrando seus fundadores e as regiões da cidade de Salvador onde o bloco foi fundado. Na terceira parte do desfile, as roupas representaram as entidades religiosas que regem as tradições do Afoxé Filhos de Gandhy. O desfecho da apresentação foi com fantasias que exaltavam as diferentes características do carnaval de Salvador, incluindo o próprio afoxé.
Um dos principais destaques do desfile, o conjunto de fantasias da Colorado contaram com bom acabamento e permitiam uma evolução tranquila dos componentes ao longo da Avenida. A leitura do enredo através das vestimentas era clara e de bom gosto, enriquecendo a narrativa proposta pela escola ao longo de todo o desfile, com destaque especial para o segundo setor da escola.
Harmonia
Outro ponto positivo do desfile da Colorado, o canto da comunidade se fez presente ao longo de toda a Avenida. Os componentes clamaram o samba com clareza e demonstravam espontaneidade para brincar o carnaval. As bossas aplicadas pela bateria ao longo do desfile estimulavam ainda mais a participação dos desfilantes, que contribuíram bem para o conjunto da apresentação da escola.
Samba-enredo
A obra que conduziu o desfile da Colorado é assinada por Léo do Cavaco, Thiago Meiners, Sukata, Cláudio Mattos e Rafael Tubino, e na Avenida o samba foi defendido pelo intérprete Léo do Cavaco. A letra buscou narrar a história de fundação do bloco Comendo Coentro, que posteriormente se tornou o Afoxé Filhos de Gandhy, destacando o trabalho dos estivadores, as entidades que inspiraram a conversão do bloco em afoxé e finalizando com as referências artísticas que celebraram a entidade ao longo dos anos. A obra conta com um refrão de cabeça que permitiu à bateria fazer do momento uma referência direta à musicalidade dos Filhos de Gandhy, sendo o momento alto de auge da letra.
A letra do samba permitiu uma imersão no ambiente do desfile, contando com elementos inspirados em um estilo tradicional de músicas para enredos relacionados à Bahia. O desempenho da ala musical comandada por Léo do Cavaco favoreceu o desempenho da obra na Avenida, ajudando a estimular os desfilantes a brincarem o carnaval. O único apontamento é a ausência na letra de mais referências à abertura do desfile, que foi majoritariamente em referência ao ativista Mahatma Gandhi, que inspirou o nascimento do afoxé. O restante do samba consegue, porém, consegue narrar com clareza os demais elementos da proposta do enredo da escola.
Evolução
Outro elemento de destaque no desfile da Colorado, a evolução da escola fluiu bem por toda a Avenida nos pontos em que foram observados. As alas estavam bem compactas e não foram observadas oscilações no andamento do desfile. O recuo da bateria foi bem executado e rapidamente preenchido pelo restante do cortejo.
Outros destaques
A bateria “Ritmo Responsa” esteve em grande noite. O ritmo baiano se fez presente na Avenida em vários momentos, contribuindo para a imersão do ambiente proporcionado pelo desfile. Vale destacar a fantasia da rainha Camila Prins com iluminação no costeiro e no adereço de cabeça, em forma de uma pérola.