Já tinha tomado um monte quando a procissão passou. Tião estava confuso com tantas roupas vermelhas e brancas ao seu redor. Tentava se localizar:
– Que ala é essa?
Aproximou-se do andor e gritou com dois beatos que carregavam a imagem do santo nos ombros:
– Cuidado com a alegoria!
Os fiéis olhavam para Tião com um misto de revolta e espanto. Mas o mulato ainda não havia se mancado. Gesticulava, gritava, exigindo mais empenho dos componentes:
– Vamos cantar, minha gente! Vamos cantar!
Era o próprio diretor de harmonia. Puxava as velhas pelo braço:
– Roda aí, minha baiana!
Bronqueava com as filhas de Maria:
– Tem que dizer no pé! No pé! – tirou o apito do bolso: – Sacode a carola! – apontava para os moradores debruçados nas sacadas e comentava com as noviças: – Estamos passando em frente aos jurados…
Um sujeito de terno branco veio tomar satisfações:
– Ponha-se no seu lugar!
Tião soprou o apito, novamente:
– Aqui é o meu lugar! Só não entendi por que a bateria ainda não entrou. Vai lá perguntar ao Louro se tá tudo em cima.
O sujeito, boquiaberto:
– Perguntar a quem?
Tião deu-lhe um empurrão:
– Ao Louro, pô! Demorou! Demorou!
Enquanto o homem de terno branco correu procurando um louro que nunca tinha visto na irmandade, Tião subiu no andor e ficou olhando lá para a frente:
– Como é que é, Quiiiiinho?! Vai puxar o samba ou não vai? – e ele mesmo resolveu
dar o grito de guerra: – Arrepiiiiiiia, Salgueeeeiro!!!!
(Publicada no Romance Policial, em 1995 – Homenagem ao padroeiro do Rio e ao grande amigo e botafoguense, Lourival de Souza Serra, Mestre Louro, que sempre fazia uma grande festa para celebrar a data)
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