Revirando recortes antigos da Passarela do Samba encontrei um pacote de fotos e, entre elas, lá estava uma de Severino Silva, feita no dia 17 de janeiro de 1997, no barracão da Viradouro. Mostra Joãosinho Trinta, braço esquerdo erguido, amparando o Caos, ou o Nada, ou sei-lá-o-quê, pois, até hoje, poucos entenderam o que representava o abre-alas da
Escola de Niterói.
A história começa na semana anterior, quando telefonava para vários carnavalescos em busca de notícias para a coluna. Com o 12º lugar do carnaval anterior, João caíra no esquecimento. Estava jururu, lá no cantinho do barracão, mas veio atender ao telefone com a boa vontade de sempre.
– E aí, alguma novidade? – perguntei.
João respondeu:
– Não… – ficou pensativo e emendou – Mas, a gente cria.
Enquanto eu sorria, João engrenou uma de suas histórias:
– Sabe o que eu estou fazendo agora?
– O que?
Foi enigmático:
– Estou fazendo o Nada!
Brinquei:
– Quer dizer que o homem que já fez de tudo no Carnaval, agora está fazendo o nada?
João voltou a sorrir. E começou a dar gargalhadas, delirando:
– Você já imaginou? Quando o nosso abre-alas passar, como é que os julgadores vão dar nota para o Nada? Como é que eles vão julgar o Nada?
Rimos bastante do absurdo, que acabou virando uma nota. Combinamos uma reportagem no barracão, onde o carnavalesco me mostraria o Nada e contaria como o havia construído.
No dia combinado, assim que cheguei, o presidente José Carlos Monassa me chamou em seu gabinete. Estava preocupado com a notinha que saíra na Passarela:
– O pessoal da Liga me telefonou. Esse negócio dos julgadores terem que julgar o Nada não pegou bem. Não posso ter problemas com os julgadores… – estava angustiado.
Na verdade, eu e João achávamos tudo aquilo muito engraçado. Severo caprichou nas fotos, documentando o Nada – o início de tudo, o momento que antecedeu o big-bang. Lembro-me ainda da primeira pergunta da entrevista que renderia uma página inteira, no domingo seguinte.:
– João, o Nada é feito de quê?
Mais gargalhadas. E a resposta “científica” do carnavalesco:
– De isopor, glitter e tinta preta.
Depois que a matéria foi publicada, equipes de TV, rádios, jornais, todo mundo foi para o barracão da Viradouro entrevistar Joãosinho Trinta sobre o Nada, o Big-Bang, a explosão do Universo e todo o carnaval que daria o primeiro título da história da Viradouro.
Lembro-me do sorriso de Monassa na Avenida, eufórico, apontando para o abre-alas que acabava de entrar, sob o delírio da plateia: – Olha lá! Olha! Esse João é maluco!