Por Will Ferreira e fotos de Fábio Martins
O Rosas de Ouro subverteu a lógica no último domingo. Se o ensaio técnico, como o próprio nome já diz, busca aperfeiçoar quesitos, a escola da Brasilândia trouxe muita emoção a todos – fruto de um trabalho que está claramente sendo bem desenvolvido na escola, como a própria apresentação do enredo “Rosas de Ouro em uma Grande Jogada” deixou claro. O céu, que fez questão de ficar azul e rosa (cores da agremiação) na entrada da instituição na passarela, apenas abrilhantou (e comoveu) ainda mais os presentes. O primeiro ensaio técnico da Roseira, que será a sexta escola a desfilar na sexta-feira de carnaval (28 de fevereiro), teve, ao todo, 56 minutos – todos eles contagiantes.
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Comissão de Frente
Estreando na escola que tem o mesmo nome da própria família, Arthur Rozas investiu no lúdico. Um tripé, que aparentemente trará a representação de uma clássica máquina caça-níquel, com três rolos giratórios, também tinha a presença de uma personagem fantasiada de Rainha de Copas. Em determinados momentos, Alices e Guardas de Copas (todos personagens do clássico infantil “Alice no País das Maravilhas”) interagiam com o tripé. É importante destacar que, em um primeiro momento, as Alices aparecem com feições raivosas, como se os guardas estivessem prendendo-as – depois, elas ficam felizes.
Mestre-Sala e Porta-Bandeira
Mesmo sendo formado apenas em 2024, Uilian Cesário e Isabel Casagrande já demonstram grande entrosamento e sincronia nos movimentos. Utilizando bastante a envergadura e a elasticidade acima da média de ambos, o primeiro casal da Roseira teve giros apurados e teve como ponto alto a apresentação na segunda cabine de jurados, com leveza na dança e um contagiante sorriso ao encarar o espaço destinado aos julgadores. Vale destacar, também, a elegância do azul e rosa fosco da fantasia de ambos – Uilian com uma vestimenta mais tradicional, Isabel com um vestido com uma saia cheia de brilhos.
Harmonia
O ensaio foi extremamente emotivo desde o esquenta. Nove dias depois do falecimento de Renan Oliveira, o Bitão, um dos diretores da “Bateria com Identidade”, após o Ensaio Super Turbinado (que teve a presença das coirmãs Vai-Vai e Nenê de Vila Matilde), toda a comunidade pareceu estar disposta a fazer uma grande homenagem a ele – e conseguiu. Desde os tradicionalíssimos alusivos da agremiação, era perceptível o quanto o canto (que chama atenção de todos que vão em ensaios da agremiação neste ciclo) seria ainda mais forte. Na primeira passada do refrão, muitos componentes choraram e os ritmistas evoluíram dentro dos naipes. Dentre os setores que mais cantaram, destaca-se o último setor – mas é importante frisar que a comunidade da Brasilândia mostrou, mais uma vez, o quanto se encontrou com a composição. Vale destacar, também, a dedicação do staff da agremiação, que pedia ainda mais canto em diversos momentos.
Na visão de Victor Lebro, um dos diretores de carnaval da instituição, é possível melhorar ainda mais: “A escola cantou bastante, mas vai cantar ainda mais. Podemos evoluir mais! Por ser o primeiro, a escola estava meio que sentindo a pista e que tende a crescer até chegar no dia do desfile e estar cem por centro”, confiou.
Já Carlos Junior, intérprete da escola, fez questão de elogiar os companheiros do carro de som: “O Osmar, vice-presidente, me escutou e me deu o maior respaldo. Ele me ouviu bastante para montar esse carro de som e conseguimos, esse ano, fazer vários ensaios fechados para aproveitar a qualidade de cada um. Estou muito feliz com eles porque, no ano passado, eu olhava para cima e eu via cordas de primeiro grau, de topo, mas eu sentia que as pessoas do carro de som eram mal aproveitadas – sendo que tínhamos alguns talentos ímpares como o Santa Cruz. Eu trouxe dois meninos que são geniais, o MB e o Xará – e, na casa, já estava o Valtinho há muitos anos. O Adalto voltou do Barroca, que era do time do Pixulé, e que era um time ímpar. Voltou porque ele é da Brasilândia, só que eu ainda não conseguia direcionar, estava cada um por si. Estava como aquele Real Madrid dos Galáticos, que não treinavam. Eu trouxe a Mônica, que saiu com o Royce do Cavaco lá atrás, e é a minha parceirona. Consegui pegar toda essa galera, colocar em dois estúdios e aproveitar o máximo deles. Depois disso, eu falei que era para tirar toda a pressão que coloquei neles e que era para brincar. Não adianta ficarmos pensando no resultado. Não adianta ficarmos pensando no que a internet vai dizer ou não, se está bom ou ruim. Você tem que estar no seu coração com aquele sentimento de que fizemos algo bom. Se alguém achou diferente, é uma coisa introspectiva de cada um. Não conseguimos conquistar todos os corações. Uma coisa que eu passei para eles quando cheguei aqui: nós rezamos, que é uma coisa que nunca fizemos. Falei que tínhamos que servir o nosso povo, não nos servirmos. Cada coração que tocarmos é a escola ganhando um pedaço de um coração de uma pessoa. É daí que sai aquele talento, é o principal do carisma que as escolas precisam ter, é daí que sai o carisma, a partir do momento que você começar a servir e tocar corações. Enquanto você não tiver uma multidão de corações tocados, o seu carisma não vai sair. Acho que começamos hoje um bom trabalho. Hoje estou em uma disciplina em que o que aconteceu ontem serve de aprendizado, mas tem que ficar por lá. A parada aqui é agora. Se hoje foi bom, é isso que vale. Ganhamos um dia”, refletiu.
Rafael Oliveira, o mestre Rafa, comandante da “Bateria com Identidade”, fez questão de relembrar que a perda de Bitão ainda se fazia presente: “A gente está de luto ainda, é recente demais. Tem muita gente abalada. Mas a gente tentou colocar a bola no chão. Fizemos uma reunião na sexta-feira com todos os ritmistas lá na quadra, a gente tinha atividade na segunda e na quarta passada e não conseguimos fazer essas atividades, cancelamos. Na sexta-feira percebi que a gente precisava levantar e acordar, porque tinha ensaio na sexta e tinha esse ensaio de hoje. A gente precisava levantar, precisava se erguer Tecnicamente foi legal, foi bacana – mas, em relação ao o clima, não foi tão bom. Não é o que a gente costuma entregar. A gente vai melhorar, vamos sentar, debater, ver quais foram os pontos, os erros e vamos acertar para os segundo e terceiro ensaios – para que, no grande dia, a gente esteja pronto.
Na autocrítica sempre sincera, mestre Rafa não escondeu nada: “Nosso ponto positivo são as nossas bossas Nós vamos mantê-las. É só executar, limpar e vamos embora. Quanto ao ponto negativo, temos que melhorar o andamento: eu quero um pouquinho mais de beat. Também precisamos fazer a limpeza da bossa que tem um apagão em que a escola canta. Eu não sei como foi a escola, mas, dentro da bateria, tivemos vários momentos que não foi legal. A gente com certeza vai ajustar e vamos embora”, disparou.
Evolução
Como já parece ser característico em tudo que envolve o desfile de 2025, o Rosas veio extremamente leve. Chamou atenção que algumas alas possuíam, até mesmo, componentes sem a camisa da agremiação, enquanto outras tinham camisetas diversas da Roseira. Para dar ainda mais dinâmica aos pulos e danças dos componentes, a agremiação distribuiu bexigões azuis e rosas – cores da instituição.
Vitor, por sinal, destacou a assiduidade dos componentes da Roseira: “O primeiro ensaio foi muito positivo! A escola compareceu com um bom contingente e está praticamente fechada para o carnaval. Nossa comunidade é dedicada a ensaiar e desde sempre está trabalhando muito – algo que deu para ver na avenida hoje. Foi um ensaio bacana, a escola cantou, fomos bem de evolução. Lógico que sempre dá para acertar uma coisinha ou outra – mas, por ser o primeiro, eu estou bem feliz. Vamos manter a energia da nossa comunidade, a escola vem de alguns resultados não muito bons e está querendo reverter essa situação. Dá para ver que dedicação, empenho e amor ao pavilhão não estão faltando. Isso tudo é o grande coringa da nossa grande jogada”, destacou.
É importante, entretanto, trazer um ponto de atenção para a escola: em determinados momentos, alguns componentes cantavam, no último verso antes do refrão, “a Rosas do meu coração”, enquanto no site oficial da Liga-SP consta que a letra oficial da obra fala “a rosa do meu coração”.
Samba
Se não figura no hall de grandes obras da história do Rosas de Ouro (que tem, certamente, uma das melhores discografias do carnaval paulistano – para muitos, a melhor) poeticamente falando, a canção passa uma energia que é difícil de ser descrita. Mais do que isso: a comunidade abraçou a canção e os arranjos, produzidos por Ricardo Rigolon, popularmente conhecido como Chanel, contribuíram para a obra crescer ainda mais quando ouvida ao vivo. O solo de abertura, por exemplo, cai em uma verdadeira explosão no carro de som – por sinal, o samba-enredo parece ter sido composto sob medida para Carlos Junior, em mais uma ótima noite.
O desempenho da canção foi muito elogiado por Carlão. “Acho que foi maior do que a minha expectativa. O Rosas de Ouro tem uma forma de trabalhar muito diferente do que estou acostumado. Eu costumava trabalhar com todo mundo na quadra. Aqui, as alas treinam em um horário e os departamentos mais presentes treinam em outro horário. Você tem alas das nove às onze, aí chegamos meia-noite e vem passistas, comissão, aquelas de departamento, bateria. Não nos vemos, só nos ensaios de rua. Nós agendamos três ensaios de rua e um teve que ser cancelado por causa da morte de um diretor de bateria, fizemos só dois ensaios de rua. Foram as únicas vezes que nos encontramos todos. Como eu estava em um caminhão muito longe, eu não conseguia sentir a pressão que eu senti aqui. Estamos ensaiados. Não estou comparando com as outras escola, estou falando de nós por dentro. Estamos ensaiados e temos tempo para melhorar. Se houve algum erro, existe um tempo hábil para que esse erro seja sanado e isso me deixa muito confortável. O samba aconteceu, pelo menos para nós, e espero que a galera que assistiu hoje fale saiba disso – e, aqueles que ainda estavam contra, abracem esse samba. É um grande samba, acho que ele tem uma matéria, uma coisa descritiva e uma parte motivacional muito grande. O medo de perder não pode superar a gana de vencer. Enquanto estivermos vivos, como diz o 50 Cent, fico rico ou morro tentando”, explicou.
Para o intérprete, é difícil encontrar algum ponto que possa ser melhorado: “Do meu segmento, eu acho que nós quebramos tudo. Com todo respeito, foi muito mais do que eu esperava. Eu vim aqui achando que eu ia encontrar cinquenta mil obstáculos, mas a avenida ficou pequena, não ficou cansativa. Eu pedi para minha esposa marcar o tempo em um cronômetro, e nós estávamos aqui perto com 42 minutos e eu pensei que estava acabando, mas eu tinha muito mais gás ainda para fazer essa parada. Por outro lado, eu já participei de desfiles em que eu falava que não tinha mais gás, estava acabando.. Acho que nós estamos nos preparando muito para fazer um espetáculo, e vejo isso com positividade”, comentou.
Outros Destaques
A “Bateria com Identidade veio inteira com uma camisa especial: nas cores rosa e preto, ela trazia, na frente, uma foto de Bitão – e, nas costas, a mensagem “Bitão Eterno”. Vale destacar, também, que todos os ritmistas estavam com calças, shorts ou saias pretos, mostrando o luto de todos por lá. À frente de cada um deles, Ana Beatriz Godói, desde 2020 como rainha da bateria.
Sempre uma atração à parte, Angelina Basílio, presidente da escola, veio fantasiada de Rainha de Copas. Ao notar o céu, que se pintou de azul e rosa, a mandatário da Roseira se emocionou, pediu fotos para os fotógrafos que estavam mais próximos e falava que “a natureza é maravilhosa”.
O belíssimo pede-passagem utilizado no minidesfile de 2024 veio para o ensaio técnico, à frente do abre-alas – que, por sinal, parece ser grande.
Colaboraram Naomi Prado, Nabor Salvagnini, Gustavo Lima e Lucas Sampaio
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