A Unidos da Tijuca realizou na noite de quarta-feira o primeiro ensaio de rua em preparação para o Carnaval 2023. O treino aconteceu atrás da quadra da escola, no Santo Cristo, na Via D1, e teve duração de 1 hora e 13 minutos. O destaque foi para a comunidade que cantou bastante o samba muito bem executado pela afinada dupla Wic Tavares e Wantuir. A bateria “Pura Cadência”, de mestre Casagrande, foi outro ponto alto conduzindo bem o andamento do samba e realizando bossas dentro da métrica do samba e do contexto do enredo. A comissão de frente comandada pelo coreógrafo Sérgio Lobato e o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, Matheus André e Denadir Garcia, também passaram muito bem. No próximo carnaval, a Tijuca vai ser a quarta escola a pisar na Sapucaí no domingo de carnaval com o enredo É onda que vai… É onda que vem… serei a Baía de Todos os Santos a se mirar no samba da minha terra’, que está sendo desenvolvido pelo carnavalesco Jack Vasconcelos.
O ensaio começou pouco antes das 22h e contou com um bom contingente da comunidade e segmentos. A animação dos desfilantes é também um ponto a se destacar mostrando que apesar de uma ida um pouco mais tardia para a rua em relação a maioria das escolas, a Unidos da Tijuca apresentou neste treino já muita coisa bem trabalhada para entregar no desfile em fevereiro. A evolução, talvez, seja o ponto que ainda precise de alguns ajustes, achar o melhor ritmo de deslocamento e alguns pequenos ajustes na arrumação de alas, mas algo totalmente normal para este primeiro treino, totalmente possível de ser corrigido até o grande dia. No final do ensaio, uma leve garoa começou a cair como se fosse “um banho de axé para purificar”.
“Achei o ensaio muito bom, ainda mais que foi o primeiro ensaio na rua. A comunidade veio em peso. E tem mais dois ensaios até dia 22 [de janeiro]. Até lá a gente vai estar quase pronto. Não vai estar pronto, mas a gente vai fazer bonito lá na Avenida (ensaio técnico). A gente está sempre melhorando. É canto, evolução, casal, é bateria. Hoje, para primeiro ensaio, foi maravilhoso! Muito bom mesmo. Vamos desfilar com 3800 componentes. A comunidade aqui é forte”, analisou Fernando Costa, diretor de carnaval.
Bateria
A bateria “Pura Cadência” foi outro ponto alto da noite. Casagrande havia prometido trazer todo o axé dos tambores da Bahia utilizando os instrumentos já familiares à bateria da Unidos da Tijuca. E neste primeiro ensaio de rua já se pode perceber estas características na utilização dos surdos, repiques e um toque especial do timbau. E o andamento do samba trouxe algo bem da Bahia, cadenciado mas sem se tornar arrastado e com as bossas bem características do que o enredo pede. No refrão principal, em “Um banho de Axé”, os tamborins puxavam uma pegada bem de Salvador, estilo de grupos de Axé originários da cidade baiana. Tudo isso sem perder as características identitárias da bateria Pura Cadência.
Talento no comando da ‘Pura Cadência’, mestre Casagrande citou ao CARNAVALESCO que vai desfilar com 272 ritmistas. Ele citou também que o nível das baterias está muito alto. “Cada ano que passa as baterias se superam é trabalhar e trabalhar pra manter esse nível alto. Tem muita coisa ainda para nossa preparação. O foco é muito grande, a gente não pode relaxar jamais. Nós ensaiamos muito dentro da quadra, a bateria foi perfeita, mas o que me impressionou foi o canto da escola, nós sabíamos que quando chegasse na rua o canto ia ser forte. Temos esse mês e em fevereiro o desfile é foco total. Parece que o povo estava aguardando esse ensaio de rua. Pode colocar aí: que ensaio!”, comemorou mestre Casagrande.
Harmonia e samba-enredo
O samba está na boca da comunidade. Pode-se perceber um excelente trabalho desenvolvido nos ensaios de quadra. Desde o início do treino, em sua maioria, a escola cantou bastante. A dupla Wic e Wantuir, pai e filha, conduziu o samba com a correção e a animação de sempre, a comunidade correspondeu. As alas iniciaram o ensaio cantando o samba com muita intensidade e mesmo do meio para o final, quando essa intensidade caiu um pouco, mesmo com o calor, ainda assim, o desempenho da harmonia continuou bastante satisfatório e o samba continuou rendendo bastante.
Destaque para o refrão principal com o ” Um banho de axé…”, além do refrão do meio e o trecho na segunda do samba ” Oh paí ó!…” quando os desfilantes levantavam os braços inclusive, declamando e olhando para o céu nesse pedaço. Bom trabalho também da equipe de harmonia comandada por Fernando Costa que a todo momento chamava cada ala para não deixar o canto diminuir. Alguns poucos componentes das alas do meio da escola ainda pode-se perceber cantando menos o samba, mas foi uma minoria bem pouco perceptível que não impactou o grande desempenho da Unidos da Tijuca.
“Acho que nós temos um samba alegre, gostoso. Quando falamos de Bahia, nos remete a um lugar de muita paz e axé, e é o que eu acho que a Tijuca vem trazendo. É um samba leve, acho que a Tijuca está saindo um pouco da bolha e voltando às suas raízes, do nosso povo preto, acho que é muito importante nós darmos esse passo”, disse Wic Tavares.
Wantuir também falou o que espera do samba tijucano esse ano na Avenida. “É como se tivesse começando, cada ano é uma emoção, uma samba e um enredo diferente. As expectativas são sempre as melhores, estou na escola mais simpática do Rio de Janeiro, com uma escola que é uma família e vem aí mais um carnaval com minha filha, ao lado de carro de som maravilhoso, e esse show de bateria que é a ‘Pura Cadência'”.
A cantor citou sua parte preferida no samba-enredo de 2023. “Eu gosto da parte “Odoyá, mamãe sereia, Orá yeyê, mamãe do ouro”, é a parte que fala do encontro da água salgada com a água doce, de Yemanjá com Oxum, me toca muito”. Já Wantuir disse: “O samba é muito bom, mas os dois refrões são brabos. Na hora que começa e a gente começa a sentir exatamente, tem um arranjo de bateria especial. O samba deste ano é tão bom quanto o do ano passado, e a gente vai ter um resultado melhor esse ano lá, com toda certeza”.
Wic Tavares também comentou a importância de ensaiar na rua com a escola completa. “A energia, primeiramente, é outra, e é legal que nós conseguimos entender como que vamos funcionar na Avenida. Na quadra a gente fica um pouco mais parado, não tem como desenvolver tanta emoção, e para mim os melhores ensaios são os de rua mesmo. A energia muda pra caramba, porque o samba é da rua, é do povo”. Wantuir completou: “Aqui que a gente apara todas as arestas, o que pode o que não pode ser, a virada de bateria essa não tá muito boa, vamos tentar mudar é assim que a gente vai de algum jeito cortando essas arestas, e quando chegar no dia do desfile está tudo 100%”.
Em 2022, a escola foi penalizada no quesito Harmonia por cacos dos cantores. O diretor Fernando Costa disse que isso não acontecerá em 2023. “Não vai tem caco esse ano”, assegurou o diretor.
Mestre-sala e porta-bandeira
Indo para o primeiro desfile dançando juntos, Matheus André, recém promovido a primeiro mestre-sala, e Denadir Garcia, mostraram um bom entrosamento e bom entendimento dos movimentos. Do mestre-sala, além de se destacar o bailado mais clássico que combina bastante com as características de Denadir, também é importante elogiar a postura e o sorriso sempre presente no rosto. Da porta-bandeira, além da precisão nos movimentos já conhecida, desta vez percebeu-se uma boa integração do bailado com o enredo. No trecho “Bota dendê e um cadinho de pimenta”, Denadir demonstrava bastante sensualidade e intensidade na coreografia sem perder suas características mais tradicionais de dança.
A dupla ainda parece buscar a melhor forma do toque e da proximidade, é coisa pouca de se trabalhar no entrosamento mesmo, que vai vindo a cada ensaio, afinal, dançam juntos a cerca de seis meses. O que também é importante corrigir é na atuação dos guardiões do casal que ainda não parecem estar no melhor do entrosamento e naturalidade de movimentos, havendo algumas imperfeições durante o ensaio na formação, deslocamento e na arrumação com o casal principalmente no início da preparação para a apresentação nos módulos.
“Para o casal de mestre-sala e porta-bandeira, ensaiar na rua tem duas vertentes: é muito bom que podemos treinar a coreografia junto com a comissão de frente, os guardiões etc. A parte ruim é que a rua é muito desnivelada, a gente pode acabar se acidentando e porr isso diminuimos a velocidade, tudo com muita calma. Eu prefiro mesmo é ensaiar na Avenida”, afirmou Denadir.
“Como esse ano é o meu primeiro estreando, a rua para mim está sendo de tudo proveitoso mesmo sendo cansativo, porque principalmente podemos sentir a energia que vamos ter no desfile”, completou o mestre-sala.
A dupla tijucana disse o que espera da avaliação dos julgadores no contexto geral do quesito em 2023. “Eu faço voto para que eles prestem mais atenção na dança tradicional. Vamos realizar tudo e fazer mais para diferenciar, porém o tradicional sempre estará presente na nossa dança. A nossa fantasia está belíssima. Um banho de axé. Com muitas águas abençoadas”, garantiu Denadir.
“Eu acredito que a vibração e a energia do desfile, somente que os julgadores consigam sentir isso também com a Tijuca”, pediu Matheus.
Evolução
Para um primeiro ensaio a escola mostrou um bom trabalho. Não se notou a formação de nenhum buraco ou grande espaçamento entre as alas e ainda que um pouco juntas demais em alguns momentos não se percebeu nenhuma ala se embolando com outra. A entrada e a saída da bateria do recuo também foi bastante satisfatória e bem treinada e o mais importante de se destacar é que a escola estava pulando e dançando com bastante espontaneidade e liberdade, sem aquelas filas rígidas que dificultam muitas vezes até o canto. Não se percebeu neste ensaio a atuação de alas coreografadas e o único movimento mais uniforme acontecia no trecho “Oh paí ó” quando os componentes erguiam o braço para cima até o refrão principal do samba, como que declamando com mais vontade cada palavra deste pedaço. Como colocado acima, é importante dar uma atenção maior à evolução dos guardiões do primeiro casal.
Outros destaques
A comissão de frente apresentou uma coreografia já bastante intensa e brindou o público parando e simulando a exibição que fará para os jurados virada para a cabine. O segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira Rafael Gomes e Lohane Lemos também se destacou com uma coreografia intensa e entrosada, arrancando aplausos de quem acompanhava na calçada e de quem vinha desfilando logo depois. A ala de baianas veio bastante elegante com roupa na sua maioria branca mas com detalhes coloridos nas saias. O timbau da bateria ajudou a iniciar o samba na arrancada colocando traço de baianidade na sonoridade do samba. Também é importante destacar o bom número do público que compareceu para acompanhar o ensaio da Unidos da Tijuca, principalmente, levando-se em conta o horário e o dia de semana, havia a presença de muitos turistas.
Colaboraram Cristiano Martins, Isadora Lima e Matheus Vinícius