“Esse enredo é um resgate ancestral, mas também um espelho do presente.” Foi com essa frase que Leandro Vieira definiu o novo projeto carnavalesco da União de Maricá, anunciado oficialmente na noite do último sábado, durante uma festa marcada por emoção, batucada e reverência à história. O tema escolhido — “Berenguendéns e Balangandãs” — promete transformar o desfile de 2026 em uma verdadeira celebração da cultura afro-brasileira, com destaque para a força ancestral e simbólica das mulheres negras.

equipe marica26 1
Fotos: Rhyan de Meira/CARNAVALESCO

* Seja o primeiro a saber as notícias do carnaval! Clique aqui e siga o CARNAVALESCO no WhatsApp

O evento, realizado na quadra da escola, no Centro de Maricá, reuniu integrantes, comunidade e convidados num clima de celebração. A atmosfera era de terreiro: tambores, danças e energia coletiva ecoaram enquanto o enredo era apresentado como algo muito além de um título ou conceito artístico — ele carregava memória, luta e identidade.

“Quando pesquisei sobre essas joias, entendi que elas eram muito mais que enfeites”, explica Leandro Vieira, com os olhos brilhando. “Eram documentos pendurados na cintura de mulheres que conquistaram sua liberdade e passaram a circular pela sociedade exibindo, literalmente, suas conquistas. Cada fruto, cada figa, cada medalha tinha um significado. Era uma linguagem cifrada que vamos decifrar no desfile. Não se trata só de beleza visual. Queremos provocar reflexões profundas, trazer à tona histórias que ficaram apagadas”.

leandro marica

Leandro, conhecido por enredos que misturam rigor histórico e exuberância plástica, encontrou no balangandã a metáfora perfeita para falar sobre mulheres pretas que transformaram adornos em armas de afirmação:

“É um enredo feminino, ancestral, com um recorte que vai além da exuberância visual. Ele me possibilita aprofundar a ideia da escola de samba como um espaço pedagógico e afirmativo, sobretudo para mulheres pretas”.

Como foi a escolha?

Para a diretoria da União de Maricá, a escolha do enredo foi imediata. Assim que o projeto foi apresentado, houve um sentimento quase místico entre os presentes.

“Foi uma sensação muito mística. Conhecer o enredo foi algo muito forte pra mim. É um enredo que representa profundamente a nossa ancestralidade e conversa diretamente com a nossa cidade e com aquilo que a gente vem planejando: um mundo melhor”, contou o presidente Matheus Santos.

equipe marica26 2

A confiança na visão artística de Leandro é total. “Ele chegou com o enredo pronto e convincente. Eu disse logo de cara: ‘não quero ouvir mais nada’. Daí pra cá, mergulhamos de cabeça nesse projeto. Todo dia é uma nova inspiração, uma nova descoberta. Estamos todos muito animados e cheios de tesão pra mostrar esse enredo ao público. Vai ser um belo desfile”, garantiu o dirigente.

Segundo Matheus, o processo criativo tem sido contagiante: “É uma mistura de confiança, alegria e contágio. Cada pessoa envolvida no projeto sente que está fazendo parte de algo maior, que vai tocar corações e provocar mudanças”.

logo enredo marica2026

Disputa de samba já com data marcada

Enquanto o departamento de carnaval começa a desenhar alas e alegorias, outra batalha toma forma nos bastidores: a disputa pelo samba-enredo. Wilsinho Alves, diretor de carnaval, garante que a competição promete ser das mais acirradas.

“Ano passado, tivemos sambas que poderiam vencer em qualquer escola do Grupo Especial. Isso mostra o quanto a premiação e a isenção de taxa de inscrição atraem grandes compositores. E isso fortalece a escola”.

As datas já estão sacramentadas: a entrega dos sambas será no dia 25 de agosto, e a grande final está marcada para 29 de setembro. A disputa ocorrerá em quatro etapas, sempre às sextas-feiras, com transmissão ao vivo e participação popular.

wilsinho marica

Sobre a opção por manter as mesmas regras, Wilsinho é objetivo: “Não há mudanças previstas. Continuaremos sem cobrar taxa de inscrição e incentivando parcerias. A premiação do ano passado foi de R$ 75 mil para a parceria campeã, e pode haver aumento este ano, conforme decisão da diretoria”.

E, quando questionado sobre a escolha por mais um enredo autoral, o diretor é taxativo: “Com o Leandro, seria um crime engessar a criatividade. Ele trouxe um tema que fala com o povo, que educa, que emociona. Isso não tem preço. Quando você contrata alguém do calibre dele, precisa dar liberdade pra ele ser quem é. O resultado é um enredo pertinente, que dialoga com a cidade e com o momento político-cultural atual. Essa mensagem é importante e vai marcar presença no desfile”.

Berenguendéns e Balangandãs

equipe marica26 3

O balangandã, peça central do enredo, não é apenas uma joia. É um símbolo de resistência, proteção e poder. Originário de expressões da língua banto — como bulanganga ou mbalanganga, que significam “balançar” ou “penduricalho” —, o nome também é considerado onomatopeico, pela sonoridade característica que a peça produz ao ser movida.

Historicamente, os balangandãs eram usados por mulheres negras como proteção espiritual, objeto de fé e símbolo de status. Confeccionados muitas vezes com ouro e prata, adquiridos através do trabalho e da luta diária, essas joias carregavam não apenas valor estético, mas também simbólico e cultural. Além disso, tinham papel importante nas religiões de matriz africana, sendo vistos como amuletos protetores contra o mau-olhado e outras forças negativas.