Imagina você construir sua equipe para o desfile e após o carnaval passar ser elogiado pelo público e imprensa especializada, terminar na oitava colocação, podendo tranquilamente estar no sábado das campeãs, e depois ver o time ser alvo da cobiça de outras escolas de samba. Assim, o Paraíso do Tuiuti saiu do Carnaval 2023 e entrou no pré de 2024. Mais um ano, a escola de São Cristóvão precisou provar na Avenida que está consolidada no Grupo Especial do Rio de Janeiro. O recado foi dado na pista. Quando quiserem adjetivar alguma agremiação de “ioiô” não chamem o Paraíso.
Desde o vice-campeonato em 2018, que teve gostinho de “campeã do povo”, como se auto intitula, a escola apresenta bons desfiles, mas com altos e baixos em quesitos, o que é comum na maioria das agremiações, inclusive, quem já coleciona títulos. É o tal do sarrafo cada vez mais alto. Além disso, o Tuiuti sempre apresenta sambas ótimos e um ritmo impecável. Ao lado da Viradouro, o Tuiuti é uma das escolas de samba que mais gosta de fazer ensaios de rua. Em novembro, o batuque começa nas ruas do bairro imperial. Todas segundas são guardadas para o treino. A trilha está segura e com alicerces fortes. Chamamos de “quilombo do samba” por tudo que envolve o Tuiuti, acima de tudo, pela comunidade preta, orgulhosa e que adora descer para louvar sua agremiação no solo sagrado da Marquês de Sapucaí.
O que reserva o futuro?
Vejo uma escola se reencontrando com um artista que sabe fazer carnaval para o Tuiuti. Jack Vasconcelos, responsável pelo desfile vice-campeão de 2018, está de volta. A professora Rosa Magalhães não ficou e não vou fazer juízo de valor se deve se aposentar ou não. Ela decide! João Vitor, merecidamente, foi para Beija-Flor. Sem problema! O Tuiuti já mostrou que sabe se reinventar. O retorno de Jack cria a expectativa de mais um enredaço e consequentemente um sambaço. Já fui avisado que vem coisa boa por aí.
O ritmo está garantido. Mestre Marcão fica! Tanta especulação, tanto falatório e ele disse sim para o Paraíso. Gratidão de ambos os lados! Marcão é um dos maiores da história do ritmo. Após a saída do Salgueiro ficou afastado do Rio, foi para São Paulo e o presidente Renato Thor abriu a porta do Tuiuti, quando poucos acreditavam que o comandante voltaria para o carnaval carioca. O casamento funcionou! Em 2022, Marcão dominou quase todos os prêmios. Esse ano, ele conquistou a premiação do jornal O Globo. O momento ideal para sair não poderia ser esse. É trabalhar, manter a excelência e impulsionar ainda mais a comunidade de São Cristóvão.
No carro de som o caminho foi parecido, mas teve despedida. Ainda assim, é inegável que o final é feliz. Wander Pires foi a maior contratação da história do Tuiuti. Brilhou! Foi valorizado pela escola e entregou muita qualidade. Dentro da Avenida, ele calou todas críticas de 2022 e mostrou que é um dos maiores cantores da história da Sapucaí. No carnaval extremamente disputado, o intérprete optou por voltar para Viradouro. Faz parte do profissionalismo. A proposta tentadora geralmente é irrecusável. O Tuiuti cumpriu o que combinou e agora confia em mais um grande cantor: Pixulé. É muito bom pensar que teremos uma das vozes mais fortes do carnaval cantando no Grupo Especial do Rio. Ele já fez tremer o Sambódromo, em 2014, pelo Império da Tijuca, e possui totais condições de repetir nesse retorno após 10 anos.
O quesito comissão de frente também passou por renovação e saída. Os coreógrafos Lucas e Karina chegaram na escola como apostas. Lucas, já tinha desenvolvido um grande trabalho no Império da Tijuca em 2022, mas ainda era no Acesso. E a estreia do Especial foi muito boa. A Estação Primeira de Mangueira apareceu e levou a dupla. Inevitável! Recusar a Velha Manga é praticamente impossível. E como fica? O quesito comissão de frente na agremiação de São Cristóvão transforma os coreógrafos. Patrick Carvalho, em 2018, colocou o nome de vez na história com uma apresentação inesquecível e arrebatadora. A promessa é que virá mais um nome e que terá totais condições de se destacar. Pelo retrospecto é impossível duvidar.
A última parte deste texto destaca o casal de mestre-sala e porta-bandeira, Raphael e Dandara, que defendem tão bem o pavilhão do Tuiuti. Talentosos, eles seguem para o Carnaval 2024. Estão consolidados no Especial e com dança que une a técnica e a sutileza pedida pelo quesito. Sem excessos, ambos praticam realmente a dança de um casal de mestre-sala e porta-bandeira.
Quando senta na cadeira em sua sala, na Cidade do Samba, o presidente Renato Thor deve parar e pensar: ‘vim de dentro da comunidade e venci’. Ser negro, líder de uma escola de samba, e carimbar o nome da sua agremiação dentro da Liesa é uma missão para poucos. A maioria que tenta não obtém êxito. É diferente no Paraíso. A cobiça de outras escolas não deve acabar em 2023, pelo contrário, mas é certo também que seguirá a dinastia de formar e/ou recuperar profissionais para o carnaval. O “Quilombo do Samba” é indestrutível! Ele se reinventa a cada desfile.