Não é segredo de ninguém que escolhas musicais e artísticas exitosas costumam ditar tendências no carnaval. O sucesso, quando é reconhecido, inspira a ponto de espelhar atitudes, em prol de um trabalho a ser desenvolvido. Ainda mais numa festa onde o julgamento tem sido cada vez mais comparativo.
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Inúmeros foram os quesitos que já sentiram na prática esse efeito. Mas o samba-enredo, enquanto gênero musical popular contínuo é quem mais eterniza dentro de seus modelos e eras os impactos das inúmeras transformações sociais, políticas e comerciais da folia popular.
O carnaval carioca, assim como sua criação musical e artística, muda de acordo como se transforma a sociedade. A própria “Era do Lacre”, inserida na sociedade digital, tem impactado letras de samba de forma efetiva, por simbolizar discursos que dentro de uma organização social em redes tem potencial suficiente para viralizar virtualmente. A tônica política foi amplamente abraçada, inclusive, na gestão do prefeito anterior e principal vilão da folia momesca, mostrando exatamente que a sociedade e sua produção cultural, musical e artística popular do carnaval andam de mãos dadas.
Musicalmente falando, a busca eterna dentro do gênero samba-enredo numa Avenida será sempre pelo eventual sacode. Não basta somente o samba passar bem. Tem que sacudir! Cair na boca do povão. A briga pelo topo das paradas voltou a colocar em evidência alguns sambas. As rodas de samba espalhadas pela cidade produzem sim um clima de reoxigenação do gênero, que auxilia demais na perpetuação e propagação da nossa amada arte. E uma coisa que a pista da Sapucaí sempre deixa bem claro é qual samba foi amplamente abraçado pelo povo.
No Carnaval 2024 o êxito do samba-enredo da Imperatriz Leopoldinense foi completo. A junção que inicialmente boa parte torceu o nariz, gradualmente, foi se mostrando uma canção que uniu bom gosto musical e uma explosão sonora ininterrupta. Tudo isso acentuado pelos trabalhos brilhantes do intérprete Pitty de Menezes e da bateria “Swing da Leopoldina”, de mestre Lolo. O alinhamento musical entre canção, cantor e ritmo ficou evidente em cada apresentação da Rainha de Ramos pelas quadras das coirmãs durante toda temporada. A ousadia de juntar sambas se converteu literalmente num sucesso antológico na pista de desfile.
A verdade é que se o assunto é musicalidade, simplesmente todas as agremiações do Grupo Especial do Rio de Janeiro possuem departamentos musicais estruturados, caso seja necessário escolher como alternativa uma junção de sambas. Ainda que a maioria delas trate essa possibilidade praticamente como última solução possível, primeiro por muitas considerarem desrespeito aos compositores e também para evitar desgastes políticos internos.
A escolha pela junção da Imperatriz no carnaval passado teve um norte conceitual delimitado de modo bem claro: produzir a melhor canção possível para brigar pelo carnaval. Uma fusão de sambas com intenção musical bem definida, portanto, sempre mostrará coerência, principalmente se for para explicar um enredo que nenhuma letra conseguiu absorver por completo ou mesmo unir canções cujo alinhamento musical proporcione uma experiência auditiva que potencialize possíveis virtudes explosivas.
Com a proximidade das escolhas de samba essa reflexão se torna necessária e pertinente. Paradigmas serão modificados e as agremiações buscarão cada vez mais junções como soluções musicais para elevarem o potencial de suas canções? Será que é possível surgir alguma junção num curto prazo capaz de ser comparada ao sucesso do “Vai Clarear” cigano de Ramos? Em samba não se tem receita de bolo. A inspiração genuína de um compositor é o que aglutina um tema e uma música através do talento, na condução da maior festa audiovisual do planeta. O melhor caminho a seguir sempre estará brilhando dentro do coração do sambista verdadeiro. Em samba-enredo, uma arte essencialmente subjetiva, não se escuta com os ouvidos, sim com o fundo da alma de quem ama esse gênero. Escolham sambas com o coração, é o que o CARNAVALESCO deseja do fundo da alma. Amém!