Segunda escola a se apresentar na segunda noite do Grupo Especial do Carnaval de São Paulo, o Águia de Ouro apresentou de maneira oficial o samba-enredo que embalará o desfile de “Mokum Amesterdã: o voo da Águia à cidade libertária”, assinado pelo carnavalesco Alexandre Louzada, neste sábado (27 de setembro), na quadra da agremiação. A canção é composta por Aquiles da Vila, Fabiano Sorriso, Salgado Luz, Lucas Donato, Marcos Vinícius, PH do Cavaco, Duda Juarez, Leandro Flecha, Fábio Gonçalves, Wagner Forte, Cabide e Chico Maia. Presente em eventos importantes para as escolas de samba paulistanas, o CARNAVALESCO entrevistou personagens importantes para a produção do desfile da azul e branca da Zona Oeste paulistana e traz opiniões e o panorama do evento em geral.

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Fotos: Will Ferreira/CARNAVALESCO

Dinâmica diferenciada

Toda escola tem um processo próprio para escolher o samba-enredo que será cantado pela comunidade. O do Águia de Ouro é ainda mais particular: toda a eliminatória é feita internamente, com a escola apenas anunciando a parceria campeã por meio das redes sociais.

Um dos compositores da obra, Aquiles da Vila, detalhou como aconteceu em 2026: “O Águia de Ouro é sempre um processo diferente, a gente sabe que é diferente. E a gente entendeu que precisava fazer um samba muito específico para o enredo sobre Amsterdam. A escola deixou muito claro que era para falar de uma terra libertária, que falava de diversidade, arte, liberdade de orientação sexual, liberdade com relação à rua da prostituição, uma série de coisas”, destacou.

Para Aquiles, se livrar de um estigma que muitos tiveram quando o enredo foi anunciado foi uma das chaves para que a obra pudesse ser bem recebida pela comunidade e pelo universo do samba paulistano: “Mais do que se apegar ao fato de ser um chamado enredo CEP [ou seja, que fala de uma cidade, um estado ou um país], a gente fez questão de entender as características do que está sendo falado. A gente está falando de um lugar que tem muita liberdade de expressão. Não existe um lugar que combina e conversa mais com o carnaval, um lugar mais democrático do que o nosso carnaval de escola de samba. A gente entendeu dessa forma. Tanto que fazemos um paralelo, no verso do ‘o rei daqui e o rei de lá’. O samba conta essa história: o homem que tem a chave de Amsterdam na mão se abraça com quem é rei na folia. Eles estão de mãos dadas e fazem uma grande festa. O grande pretexto, o grande mote desse enredo é esse”, frisou.

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Ar noventista

Muitos dos que tiveram a oportunidade de conhecer a obra antes do anúncio oficial elogiaram a obra por alguns motivos em específico. A canção, bastante animada, tem letra simples e um verso que extravasa a irreverência da maior festa popular do planeta logo no refrão: “Eu vou ficar bem louco nesse carnaval”. A obra inteira, entretanto, lembra sambas-enredo antigos.

Aquiles destacou que, nas reuniões com integrantes da própria escola durante o processo interno para escolha da canção, o objetivo da agremiação era bastante claro: “A gente se reuniu e pensou que o que cabe para esse tipo de tema é uma melodia extremamente leve, gostosa e popular para ser cantada. Era assim que a escola queria e foi assim que a gente levou para as finais. A escola fez um corte, eliminou praticamente metade das peças e, a partir dali, o Águia pediu que fizesse um polimento do samba. A gente fez esse polimento, fizemos uma devolutiva muito rápida e eu acho que a gente acabou sendo muito feliz em relação a isso, atendendo de fato todos os pontos que a escola pediu e que Amsterdam merece”, comentou.

Salgado Luz, outro compositor entrevistado, complementou: “Era exatamente isso que a escola queria. Era isso mesmo: resgatar esse carnaval de antigamente. O enredo pedia isso e a comunidade estava precisando de um samba como esse, daquele tempo do Águia de Ouro quando ensaiava embaixo do Viaduto Pompeia. Foi essa a intenção do nosso time”, relembrou.

Antes de inaugurar a atual e suntuosa quadra, na avenida Avenida Presidente Castelo Branco (uma das pistas laterais da Marginal Tietê), o Águia ensaiava onde hoje está a rua José Benedito Boneli, a cerca de quatrocentos metros de onde atualmente está localizado o Allianz Parque.

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Unanimidade

Quando perguntados sobre a parte favorita do samba, todos eles destacaram o refrão de cabeça. Para explicar o motivo pelo qual citou tal trecho, Aquiles relembrou uma das faixas que fizeram a história do gênero samba-enredo – “Festa Profana”, canção eternizada pela União da Ilha do Governador em 1989: “É difícil arriscar, mas eu acho que o refrão de cabeça conta toda a história. É assumir, de fato, o lance do ‘ficar bem louco’, é assumir de fato uma postura da folia. A gente já teve um samba clássico dos anos 1980 no Rio de Janeiro que ‘eu vou tomar um porre de felicidade’, que toca em tudo que festividade hoje. O Águia aposta nisso e não é aleatório: é com o enredo de um lugar que de fato é libertário e aposta na individualidade, na liberdade humana, nas próprias escolhas. A gente vai trazer um ótimo resultado com esse tipo de solução de linguagem de música. É isso que o Amsterdam pede e que o Águia de Ouro vai vestir de fato”, afirmou.

Além de concordar com o parceiro de composição, Wagner Forte revelou um sentimento maior que a gratidão pelo Águia ter escolhido a obra também composta por ele: “São os dois primeiros versos do refrão, mesmo. É o que o Aquiles falou: eu acho que a gente, pensando no samba como um todo, partiu dos dois primeiros versos, que são fundamentais e que resumem o enredo todo. Nós vamos ficar bem louco de carnaval, mesmo. A gente já está louco de felicidade de ter ganho esse samba. Essa escola, para mim, significa muito. A primeira vez que eu desfilei numa escola de samba foi numa comissão de frente do Águia de Ouro, há dez anos. Ganhei a disputa de samba-enredo de 2019 e, agora, ganhei mais um com essa parceria maravilhosa. É fantástico! Eu já estou louco, não sei o que falar, mais. Nem precisa de carnaval, já estou louco desde hoje”, brincou.

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Diversão aprovada

Todos os ouvidos pela reportagem tiveram sensações semelhantes em relação ao samba – e isso vai muito além da aprovação da obra. Sidnei Carrioulo Antonio, presidente do Águia de Ouro, abriu a série de impressões: “Eu, particularmente, gostei. Eu não sou de achar que sempre o que é meu é melhor, não. São casos e casos de samba. Eu acho que esse samba é um samba gostoso, é um samba que resgata um pouco a coisa do samba enredo divertido. Para a gente falar desse assunto, o foco não é só Amsterdã: o foco também é liberdade e felicidade. A música nos transporta a esses dois assuntos: liberdade e felicidade. Das pessoas que já ouviram o coro que nós montamos, todo mundo está feliz. Agora, vamos tirar a prova dos nove, na hora que a gente apresentar para toda a comunidade”, destacou.

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Carnavalesco da agremiação, Alexandre Louzada deu a entender que a canção pode ganhar todo o carnaval paulistano: “Eu participei de cada pedacinho da escola. Quando eu ouvi pela primeira vez, depois de gravado e depois do samba todo ajeitado, eu fiquei muito encantado. Me fez lembrar os sambas de antigamente, os sambas mais empolgados. A gente vai trazer uma alegria muito grande não só para o Águia de Ouro, mas para o Carnaval de São Paulo”, prometeu.

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A tradicionalíssima dupla de intérpretes da escola foi pelo mesmo caminho. Douglinhas Aguiar falou pelos dois: “A gente gostou demais. Eu acho que esse samba resgata a brincadeira do carnaval. É um samba que vai tratar de um assunto que é Amsterdã, uma cidade libertária, uma cidade livre, onde os pensamentos são livres, as pessoas são felizes. Para representar essa cidade, a gente não podia vir com o samba sisudo, para baixo. É um samba muito explosivo e muito alegre”, comentou.

Serginho do Porto complementou com uma analogia repleta de recordações: “É um samba que tem a cara daqueles sambas dos anos 1990, em que você botava o LP ou o CD para tocar, ia embora para a rua, ia para os outros lugares e o samba ficava na sua memória. Esse é o samba do Águia de Ouro para o Carnaval 2026”, finalizou.

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Além do samba-enredo

Se o lançamento da obra que embalará o desfile de 2026 era a cereja do bolo, o evento inteiro teve uma série de atrações pertinentes para o mundo do samba. A apresentação das fantasias também era muito aguardada – e trouxe elogios proferidos na quadra, sobretudo quando as alas em específico eram citadas. Também houve apresentações com segmentos da agremiação e, para encerrar a noite, um show com a banda Casa Nossa.