Na noite da última segunda-feira, o Paraíso do Tuiuti realizou mais um ensaio de rua e fez pulsar o bairro de São Cristóvão com energia e coletividade. O “Quilombo do Samba” cantou com firmeza a obra de 2026, amparada pela condução segura e vibrante de Pixulé, que manteve o nível do canto, inclusive nos trechos em iorubá, do início ao fim. O casal Vinícius Antunes e Rebeca Tito, em seu primeiro ano juntos, atravessou o trajeto com elegância e vigor, exibindo entrosamento e um bailado que dialoga com as exigências do novo modelo de julgamento. Já a comissão de frente, coreografada por David Lima, apresentou imagens potentes inspiradas no universo de Ifá, em sintonia com o enredo “Lonã Ifá Lukumí”, desenvolvido pelo carnavalesco Jack Vasconcelos. A escola abrirá os desfiles da terça-feira de carnaval.

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COMISSÃO DE FRENTE

A coreografia de David Lima chega com força. A comissão de frente do Tuiuti se apresentou com um vigor que atravessou todo o trajeto: energia de vida no corpo, samba na ponta da língua, uma presença que irradia coletividade.

Há um momento especialmente bonito na coreografia. Os integrantes formaram um círculo no chão, dobrados sobre os próprios joelhos, como se fossem peças de um grande tabuleiro humano. No centro, quatro bailarinas dançam em volta do pivô, desenhando movimentos afros.

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Foto: Marcos Marinho/CARNAVALESCO

A imagem lembra imediatamente o Opanifá, o tabuleiro sagrado utilizado no sistema divinatório de Ifá. É uma referência que não precisa ser sublinhada para aparecer: está ali, materializada na roda, no chão que vira altar, no corpo que dança.

MESTRE-SALA E PORTA-BANDEIRA

Vinicius Antunes e Rebeca Tito, em seu ano de estreia como casal, evoluíram na rua esbanjando entrosamento. O bailado solto, elegante e preciso na execução dos movimentos marcou a noite de ensaio.

Rebeca gira com a elegância clássica de uma porta-bandeira, enquanto Vinicius, um furacão em cena, brinca com o próprio corpo. Ele dobra o eixo, gira apoiado em uma só pena, contorce linhas, exibe vitalidade sem perder precisão. A suavidade de Rebeca e a vibração de Vinícius se encontram numa dança que respira e se renova.

Quando o samba exalta Orunmilá no trecho “Babá Moforibalé, Babá Moforibalé / Orunmilá taladê, Babá Moforibalé”, a dupla performa uma dança de acento latino, lembrando o resgate da tradição Ifá Lucumí no Brasil veio de Cuba.

Na simulação das cabines espelhadas, o casal ainda busca maior demarcação da coreografia para cada lado da avenida. Mesmo assim, é nítida a atenção ao novo modelo de julgamento.

Rebeca destacou a dedicação e o estudo contínuo da dupla: “Estamos estudando passo a passo, movimento por movimento, para chegar ao desfile com tudo muito bem construído. Tem sido muito bom poder estudar nossa dança. A gente observa os erros para melhorar e alcançar o nível que o Tuiuti merece. Todo esse processo dos ensaios na rua, somado ao trabalho diário com a nossa coreógrafa Celeste, tem feito a gente evoluir muito”.

Vinícius explicou que essa temporada de rua tem sido um período de estudo para o casal. Ele contou que os ensaios estão servindo para testar movimentos, observar a reação do público e ajustar a coreografia dentro da energia do Tuiuti. “Estamos experimentando dentro do que a dança do mestre-sala e da porta-bandeira permite e dentro do que a nossa coreógrafa pede. A partir do mês que vem, com a abertura dos ensaios noturnos no Sambódromo, chegaremos com a proposta já consolidada. O próximo Carnaval traz desafios atípicos, como a cabine espelhada. Por isso a palavra ‘estudo’ virou nossa bússola.”, declarou o mestre-sala.

HARMONIA E SAMBA

Para quem vinha torcendo o nariz para o samba do Paraíso do Tuiuti por causa dos refrões em iorubá, o ensaio deu uma resposta direta: não há motivo para preocupação. Com o time musical bem ajustado, a comunidade cantou de forma vibrante, segura, mantendo o pulso do samba sem queda perceptível em nenhuma ala. Os trechos em iorubá foram entoados com naturalidade e firmeza, e o canto ocupou a rua do início ao fim.

No quesito harmonia, Pixulé tem papel fundamental. O intérprete organiza e impulsiona o canto com autoridade técnica: suas chamadas estruturam a resposta da comunidade, e sua emissão sustenta o equilíbrio entre carro de som e alas. Ele conduz o fluxo do samba, reforça entradas decisivas e mantém o nível de energia constante ao longo do ensaio.

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Foto: Marcos Marinho/CARNAVALESCO

Ainda assim, há pontos de atenção. Em alguns setores, nota-se que parte dos componentes ainda oscila na letra, especialmente nos trechos mais extensos. Não compromete o desempenho geral, mas indica onde o trabalho de harmonia pode avançar. O Tuiuti já apresenta um canto coeso e bem alinhado. Com mais alguns ensaios, a tendência é que essa potência ganhe ainda mais corpo e densidade.

EVOLUÇÃO

A evolução do Paraíso do Tuiuti flui com uma leveza que dá gosto de ver. Os componentes avançam brincando com o samba, cantando, sorrindo, deixando o corpo se deslocar com naturalidade. Há uma espontaneidade decisiva nisso, quando pensamos o que significa, de fato, evoluir no desfile. A escola se deslocou com alegria, e a alegria, aqui, é projeto no Quilombo do Samba.

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Foto: Marcos Marinho/CARNAVALESCO

No entanto, essa naturalidade precisa vir acompanhada de precisão. Em alguns momentos do ensaio, sobretudo entre a bateria e o segundo casal, abriram-se buracos perceptíveis no avanço das alas. Nada que comprometa o conjunto, mas é um alerta importante para a evolução dos próximos ensaios. O desafio é manter a fluidez natural dos componentes com a precisão do avanço das alas. Ajustado esse ponto, o Tuiuti tem tudo para unir o melhor dos dois mundos: a espontaneidade que é marca da escola e a precisão que garante a força do desfile.

OUTROS DESTAQUES

A”Supersom”, de mestre Marcão, deu um espetáculo à parte no ensaio de rua desta segunda-feira. A bateria atravessou São Cristóvão com uma vitalidade contagiante, lançando bossas que brincam com ritmos latinos, um tempero quente que empurra o samba pra cima e levanta quem está na calçada.

Houve ainda uma imagem que fechou a noite com delicadeza. No fim do ensaio, pouco antes da bateria sair do recuo, Marcão tirou o boné e cumprimentou Pixulé num abraço de agradecimento. Um gesto simples, mas poderoso, que diz muito sobre a parceria que os dois vêm construindo.

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Foto: Marcos Marinho/CARNAVALESCO

A ala de passistas também brilhou. Conduzidos por Alex Coutinho e Jorge Amarelloh, acompanhados pelo filho Heitor, que segue os passos dos pais desde pequeno, os passistas cruzaram o ensaio com firmeza, brilho e naturalidade. O trio puxou a ala com graça e energia, reafirmando o que já se sabe: a ala de passistas do Tuiuti segue entre as melhores do carnaval carioca.