A Portela está pronta para virar mais uma página importante da sua história — e, dessa vez, com um enredo que não apenas celebra a ancestralidade, mas também convida à reflexão profunda sobre o Brasil que fomos, somos e ainda podemos ser. Para o Carnaval 2026, a azul e branca de Oswaldo Cruz e Madureira aposta em uma proposta sensível e simbólica: “O Mistério do Príncipe do Bará – A oração do Negrinho e a ressurreição de sua coroa sob o céu aberto do Rio Grande”. O título já anuncia o mergulho que a escola fará no universo da espiritualidade afro-gaúcha, evocando mitos, personagens e memórias que resistiram ao tempo e ao apagamento. * LEIA AQUI A SINOPSE DO ENREDO

logo portela2026

* Seja o primeiro a saber as notícias do carnaval! Clique aqui e siga o CARNAVALESCO no WhatsApp

O ponto de partida é carregado de significado. Pela primeira vez, o carnavalesco André Rodrigues assina sozinho o desfile da maior campeã do carnaval carioca. Seu antigo parceiro, Antônio Gonzaga, agora trilha novos caminhos na Grande Rio. A mudança marca um novo ciclo criativo para a Portela, e também para André, que, pode conduzir seu olhar com ainda mais liberdade. O artista poderá constrói um enredo que entrelaça religiosidade, oralidade, poesia e imagem com a delicadeza e a força que lhe são características.

Esse novo tempo portelense também começa com Junior Escafura, que estreia como presidente da escola. E logo em sua primeira escolha, ele aponta para um caminho corajoso: tirar o foco dos territórios mais explorados do carnaval e levar o olhar para o Sul do país, onde pulsa uma história negra potente e, muitas vezes, invisibilizada. A Portela se propõe, mais uma vez, a ser farol.

No coração da sinopse está o Príncipe Custódio, figura histórica que teria sido monarca do Benin, capturado e trazido ao Brasil. Mas o enredo não o retrata como vítima: ele chega como rei, como líder, como entidade viva. No Rio Grande do Sul, não apenas sobrevive, ele organiza, cura, ensina. Funda o Batuque, guia seu povo e torna-se símbolo de força espiritual. É o “Príncipe das Encruzilhadas”, ponte entre mundos, entre tempos, entre reinos.

Outra figura que ganha novo significado na narrativa é o Negrinho do Pastoreio, personagem popular do imaginário gaúcho. Na versão portelense, ele não é apenas o menino escravizado em sofrimento: ele representa a alma negra indomável, que guia caminhos e se eleva como protetor. É o sagrado se manifestando através dos que resistiram.

Ao unir esses dois pilares, Custódio e o Negrinho, com entidades como Bará e Sakpatá, o enredo desenha uma travessia onde a dor vira força, e a fé, caminho de liberdade. A coroa perdida, símbolo da realeza negra arrancada pela violência da escravidão, é restaurada no céu aberto do Sul, iluminando o caminho de volta às raízes.

Este não é apenas um enredo bonito. É necessário. Num país que ainda se vê às voltas com o racismo estrutural, que precisa reaprender a olhar para si, a Portela oferece um desfile que vai além da estética: quer provocar, educar, emocionar — tudo ao mesmo tempo. Quer desfilar para contar, mas também para transformar.

Em sua essência, mais do que guardiã da memória do samba, a Portela se apresenta, como agente ativo da cultura e da identidade brasileira. Ao se debruçar sobre uma geografia pouco retratada e exaltar reis negros em solo sulista, a Majestade do Samba dá voz a um Brasil que ainda pulsa, canta e resiste.