Por Will Ferreira e fotos de Fábio Martins (Colaboraram Gustavo Lima, Lucas Sampaio, Nabor Salvagnini e Naomi Prado)
Chuvas de verão são sempre um temor na cidade de São Paulo. Não apenas por conta da chance de enchentes e blecautes – mas, também, pelo quanto elas podem atrapalhar dinâmicas envolvendo escolas de samba, que estão a cada momento mais próximas do momento mais aguardado após um ano inteiro de trabalho. Neste sábado (01), a Estrela do Terceiro Milênio fez o segundo ensaio técnico no Anhembi para defender o enredo “Muito além do Arco-Íris – Tire o Preconceito do caminho que nós vamos passar com o Amor”, que será o sexto a ser apresentado no sábado de carnaval (01 de março). Mesmo com condições climáticas bastante adversas, alguns quesitos que costumam ter problemas com umidade (como Mestre-Sala e Porta-Bandeira e Bateria) tiveram ótimo desempenho.
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Comissão de Frente
Os comandados de Régis Santos, premiados com o Estrela do Carnaval 2023 no quesito, vieram com um figurino diferente do apresentado no primeiro ensaio técnico, mas foi a única grande mudança perceptível na apresentação. Se ela foi inteiramente realizada em cima de um imenso tripé cenográfico na primeira passagem da escola no Anhembi, a sina se repetiu – algo que, inclusive, veio bem a calhar, evitando contato com uma passarela cheia d’água. Em relação à coreografia, a maioria dos personagens se vestiu como seguidores de religiões conservadoras, que tentam enxotar integrantes de grupos minoritários (temática do enredo da agremiação) e são vencidos por eles.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Habitualmente, o quesito costuma sofrer quando a chuva aparece. Não para Arthur Santos (Revelação do Carnaval 2024 de acordo com o Destaques do Ano, também organizado pelo CARNAVALESCO) e Waleska Gomes: mais que seguros, eles tiveram uma excelente atuação – mesmo com a chuva bastante forte que caía e com a passarela molhada desde antes deles entrarem no local. A dupla, inteiramente de verde, não se fez de rogada e cumpriu todas as obrigatoriedades do quesito e também fez questão de mostrar entrosamento no segundo ano de bailado conjunto. O que mais surpreendeu, entretanto, foi a quantidade de giros do casal, que parecia estar em asfalto seco. Por sinal, ambos estavam com calçados que não eram específicos para a chuva, o que engrandece ainda mais a exibição.
A chuva, é claro, dominou as palavras da dupla após a exibição: “Foi tudo incrível. Um pouco mais molhadinho que o primeiro, claro. Nós tivemos a diversidade da chuva, que é ótimo para a gente colocar a nossa coreografia pa ra jogo, ver como funciona, como o nosso corpo responde. Afinal, a gente ensaia para isso: para ver todos os erros e todos os acertos. No final, foi incrível”, disse Arthur. Waleska seguiu a mesma linha: “Na chuva é um grau de dificuldade muito maior. O pavilhão pesa muito, e aí é hora de colocar a técnica em jogo. Com todas as adversidades, os nossos jurados realmente foram perfeitos, A gente já toma bastante chuva aqui e é claro que é uó: estragou o penteado, por exemplo. Nunca mais venho de cabelo solto, foi a primeira vez e a última! Mas a técnica, brincadeiras à parte, foi muito boa. A gente ficou bem feliz hoje”, comentou.
Nada que não possa melhorar, entretanto: “Calma, calma, calma. Venham no terceiro ensaio, que é o último – mas, ainda assim, a gente vai falar que tem coisa para melhorar. Sempre é possível dar algo a mais – mas, aí, são coisinhas internas que a gente não pode falar. A gente finge que está tudo bem. Roupa suja se lava em casa”, prometeu.
Harmonia
A Estrela do Terceiro Milênio é conhecida, entre outros tantos motivos, pela força da comunidade que a mantém. Vindos do Extremo Sul da cidade de São Paulo, com mais de 40 quilômetros de distância entre a quadra da agremiação e o Anhembi, nada parece deter a alegria e o canto dos componentes da instituição. Se a chuva era um teste, faltou avisar São Pedro que o Grajaú, como canta o samba-enredo de 2025, mostrou seu valor – mais uma vez. Além de mais uma competente exibição de Grazzi Brasil e Darlan Alves, intérpretes da instituição, vale ressaltar a potência do carro de som da instituição – que estava sob os cuidados do diretor musical da Coruja, Rodrigo Schumacker, sempre próximo da ala musical da escola.
Darlan trouxe um detalhe que apenas quem está na escola poderia falar: “Primeiro que já foi um dia muito difícil para a nossa comunidade chegar até aqui, choveu muito lá no Grajaú. Quando estávamos conversando antes de vir para o ensaio hoje, eu pensei que hoje vai ser um dia complicado, todo esse fator emocional vai passar ali para a gente no carro de som. Vamos ter que cantar bastante para poder colocar esse gás na galera. Já é difícil vir do Grajaú para cá, ainda mais com chuva, foi um fator complicado. O carro de som hoje estava realmente em uma pegada, uma energia muito diferente do primeiro ensaio. Nós estávamos em uma sintonia muito boa, foi muito bom o ensaio, foi uma troca de energia muito boa. Quando começou a chover e água começou a cair todo mundo começou a gritar e eu falei que hoje seria incrível – e foi. O carro de som está de parabéns, todo mundo foi realmente sensacional, a troca de energia hoje foi muito boa”, parabenizou.
Grazzi concordou: “Eu acho que na dificuldade é que nós vemos o quanto estamos juntos mesmo, porque realmente foi difícil. Na dificuldade é que nós vemos a força que temos, nos juntamos mais. oo primeiro ensaio foi maravilhoso e sempre buscamos ficar melhores, e esse foi ainda mais caloroso. Nós estávamos nos olhando, nos unimos e cantamos. Como ele disse, toda essa comunicação de lá para cá, daqui para lá, é maravilhosa. Acho que hoje foi mais especial. Como ele disse, vir do Grajaú não é fácil. Eu cheguei do Rio de Janeiro hoje, demorei quatro horas a mais para chegar do que o normal. o Grajaú é isso, é essa energia maravilhosa e deu tudo certo”, destacou.
Evolução
Com diversas alas com adornos (como bexigas e objetos que eram segurados pelos componentes), a dinâmica da escola não foi prejudicada pela chuva e não foram notados buracos ou alas emboladas ao logo de todo o desfile. Com a chuva que não parava e com a passarela molhada, o que foi notado pela reportagem foi o natural cansaço na altura dos setores E e F (os últimos de cada lado) de alguns componentes, já que o volume d’água foi bastante alto. Nada que prejudique o andamento muito competente de tal quesito ao longo de toda a exibição – até porque, se alguns aparentavam estafa, a grande maioria mantinha a movimentação pelo companheiro.
Samba
Cheia de frases fortes, a canção claramente já está decorada pela comunidade e chamou atenção de quem estava na arquibancada. Além da obra, a Pegada da Coruja, bateria da escola, também marcou alguns trechos da obra com convenções ou apagões – no segundo ensaio técnico da agremiação, chamou atenção a paralisação completa dos ritmistas em alguns momentos quando o verso “Que vá pro inferno a sua moral” era executado. Se já foi dito anteriormente, Grazzi Brasil e Darlan Alves tiveram outra grande noite: enquanto ele aparentava estar mais focado na condução do samba, ela, desde 2022 na escola, mostrou-se bem à vontade para conclamar a comunidade a cantar ainda mais alto.
Mestre Vitor Velloso, ritmista-mor da Pegada da Coruja, mostrando muita personalidade, não escondeu o quanto as condições climáticas prejudicam o segmento em questão: “Nunca é bom fazer ensaio debaixo de chuva. Infelizmente a questão de afinação é difícil, andamento também. Todas as marcações complicam por causa da chuva – mesmo tendo plástico. Acho que serviu para sentir o clima mais uma vez, da bateria e da galera. Serviu muito para isso. Todas as bossas bem encaixadas, muito bem feitas. Serviu para poder analisar mais uma vez esse lado, já que, em questão de afinação e de equalização, a chuva, infelizmente, atrapalha”, comentou.
O mestre de bateria também foi bastante sincero ao falar sobre pontos de evolução dos ritmistas: “Tivemos um probleminha no primeiro ensaio em relação ao andamento e hoje não conseguimos sentir isso por conta da chuva. Para o próximo, vamos focar mais nisso e ir melhorando durante os ensaios da semana”, pontuou.
A dupla de intérpretes trouxe outra perspectiva em relação à chuva e ao quesito: “A arquibancada hoje estava um pouquinho mais distante porque eles estavam lá embaixo (da cobertura, se protegendo da chuva) e geralmente nós vemos a galera na grade. Nós vimos eles mais distantes, mas o samba tem um fator emocional, ele traz nos seus versos mensagens e todos nós nos identificamos com esse samba. Sabemos da importância de cantar esse samba, do desafio de cantar pois foi um tema corajoso que a escola, que o nosso presidente Silvão e o Murilo Lobo colocaram para a nossa comunidade. Ele foi muito bem aceito pela comunidade do samba também e sabemos desse desafio, da importância de poder estar bem e poder representar esse samba. E nós percebemos que o Anhembi está ali trocando essa energia com a Milênio, principalmente nas nossas paradas, em que fazemos os paradões, e a galera responde cantando principalmente na Monumental. É lindo vermos a arquibancada trocando essa energia conosco. Você vê que no Anhembi já tem os leques em referência a uma das nossas alas, também. Essa troca é incrível, é muito bacana”, destacou Darlan.
Grazzi foi mais sucinta: “O carnaval é isso, o samba faz isso, essa comunidade está muito bonita. Eu sou muito suspeita”, frisou.
Outros Destaques
Provando a força da própria comunidade, a Pegada da Coruja teve à frente dos ritmistas duas princesas: Marcela Cavalcanti e Geovanna Pyetra. Ambas participaram do programa Estrelas do Amanhã, iniciado em 2022 pela própria agremiação para revelar novos nomes para a folia.
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