O primeiro enredo afro da história dos Gaviões da Fiel, obviamente, teria uma gravação para o CD e para os streamings marcante. Para simbolizar o momento especial, os integrantes da agremiação do Bom Retiro fizeram questão de utilizar um adorno de cabeça que é conhecido na Terra-Mãe por diversos nomes: quipá, bobó, kufi, yarmulke ou ekete são algumas das nomenclaturas utilizadas. Quarta escola a desfilar no sábado de carnaval (01 de março), a escola apresentará o enredo “Irin Ajó Emi Ojisé – A Viagem do Espírito Mensageiro”, desenvolvido pelos carnavalescos Júlio Poloni e Rayner Pereira, com samba composto por Grandão, Sukata, José Rifai, Ovelha JB, Juliano, Guga Pacheco, Gabriel Lima, Japa Mooca, Wesley, Morganti, Andrezinho, B. Cardoso, Gladzik, Renne Rocha e Dentinho do Morro. O CARNAVALESCO esteve presente na gravação da faixa, no dia 13 de outubro, na Fábrica do Samba, e notou que, além do já citado adorno, uma outra característica foi muito exaltada por alguns dos principais integrantes dos Gaviões – e esta não pode ser vista, apenas ouvida.
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Cadência pura
Logo ao ser perguntado sobre o andamento da Ritimão, bateria da agremiação, mestre Ciro Castilho fez questão de frisar um detalhe importante: “O andamento de gravação vai ser 140 BPM (batidas por minuto). A gente espera manter o 140, o 142, para a avenida também. Vai ser algo diferente para nós, mas a proposta é essa para esse ano. Estamos vindo com esse andamento mais cadenciado nesse ano porque a gente acredita que ele valoriza muito esse samba. Se a gente colocar um andamento muito para a frente, a gente pega um samba que é diferenciado, que a gente acredita que é realmente um samba diferente, e iguala ele aos demais. Quanto mais andamento colocar nesse samba, mais você iguala e perde o brilho dele. A proposta vai ser essa, um pouco mais cadenciada”, pontuou.
Dentinho do Morro, um dos compositores da canção, fez a mesma observação: “Eu sou nascido também no samba, fui mestre de bateria há muitos anos e esse samba ajudou muito a bateria a fazer as bossas, no ritmo – que é um ritmo empolgante. Todo mundo sabe que o nosso samba é diferenciado e eu acho que a gente vai chegar na avenida muito forte, com a comunidade cantando o samba. O samba é muito bom e eu acho que, nos ensaios técnicos, não só como nos ensaios mas como nos desfiles, vai ser sucesso total. A expectativa é a melhor possível. Os Gaviões estão vindo para as cabeças, pode ter certeza”, prometeu.
Quem também falou algo semelhante foi Rafael Malva, popularmente conhecido como Rafa do Cavaco, diretor musical da instituição e arranjador. Ao ser perguntado sobre o principal : “A primeira coisa que eu pensei foi no fato inédito de ver os Gaviões com um enredo desses. Um enredo afro pela primeira vez na história da escola. A gente tem que tomar conta em todos os detalhes possíveis: desde a escolha do samba – e, agora, na ideia do andamento, algo que a gente vai priorizar muito e que vai ser algo um pouco mais cadenciado. Esse samba pede um andamento mais cadenciado, e isso ficou claro nas conversas que a gente já teve já com o mestre Ciro – a gente tem esses detalhes musicais, com esse andamento mais para trás. Isso, querendo ou não, dá muitas ideias para o samba. Não só na parte de canto, de contracanto, como as partes também de harmonia, de cordas, de abertura de voz e também nas bossas da bateria. A minha parte foi pensando nisso tudo. É um samba que tem muitas variações melódicas é muito rico na musicalidade. Não só na musicalidade de harmonia, de cordas, mas também da percussão, da bateria em si. Ele tem muitas nuances de vários ritmos diferentes. A nossa linha foi procurar manter essa linha afro, esse lance bem raiz, bem ancestral mesmo, no samba”, refletiu.
Força e procedimento
Os Gaviões da Fiel costumam exaltar três características que tornaram-se um lema da instituição: lealdade, humildade e procedimento. E, de acordo com alguns importantes integrantes da instituição, é o último adjetivo que permeia a vitalidade alvinegra. Leandro Machado, um dos diretores de carnaval da agremiação do Bom Retiro, explica quem teve preferência para ser ao convidado para a gravação: “A seleção é feita seguindo o critério de assiduidade. Aquele componente que está mais presente no ensaio, que está mais presente no barracão, que se faz mais presente, é aquele que tem preferência para fazer esse tipo de gravação”, destacou.
Já Ernesto Teixeira, intérprete da instituição, também aproveitou para comemorar a quarta colocação no desfile de 2024 – que fez com que a agremiação retornasse ao Desfile das Campeãs após treze anos: “Os Gaviões estão muito fortes. Os Gaviões estão se reconstruindo nos últimos tempos. Prova disso é o resultado que a gente já teve no carnaval do ano passado. Entendo que esse ano aqui os Gaviões vêm melhor ainda”, prometeu.
Inspiração africana
Pela primeira vez na história, os Gaviões trarão um tema afro. E é claro que, para muitos componentes, tal característica do samba-enredo é marcante por si só. Leandro Machado é um deles: “A gravação foi algo inédito por ser o primeiro enredo afro dos Gaviões. Inicialmente parece um enredo difícil, mas é um enredo e é um samba contagiante. Eu tenho certeza que, quando as pessoas ouvirem nos streamings, nas rádios, o samba vai contagiar e todo mundo vai pegar muito fácil a letra – assim como a nossa comunidade já pegou. O Gaviões vem forte mais uma vez para a avenida”, comentou.
Rafa do Cavaco concordou: “É uma pergunta difícil… primeiro, já vão querer ir atrás dos Gaviões pelo lance de ser um enredo inédito.E pelo samba também, eu acho que o samba se sobressaindo conforme a gente vai cantando, tocando e fazendo ensaio. É um samba que, para os Gaviões e acho que para o mundo do carnaval paulistano também está despontando muito bem como um dos sambas do carnaval. A gente está muito feliz! Quando o pessoal ouviu o samba, eles ouviram com muitos detalhes em harmonia, em bateria, com muita variação de melodia de canto. Resumindo, o samba tem essa ideia. Vamos buscar o melhor para nossa escola. Tem tudo para dar certo. É um enredo inédito e que vai dar muito bom para a gente”, afirmou.
Mestre Ciro, ao comentar os movimentos ritmícos que a Ritimão fez, aproveitou para exaltar a canção: “Para a gravação, a gente tem uma bossa no refrão do meio, uma no refrão principal, e a gente tem algumas diferenciações. A virada de dois, por exemplo, não é virada de dois: é uma parada seca, tem um timbau ali com a conga. Depois da cabeça do samba a gente tem uma outra acentuação na melodia – que não chega a ser uma bossa. São algumas versatilidades que a gente tentou colocar para engrandecer a melodia desse samba que a gente está gostando demais”, confessou.
Por fim, Gabriel Lima, um dos compositores da canção, comenta a satisfação de compor obra já tão querida: “É uma emoção muito grande. A gente sempre fica nessa expectativa, a gente não faz samba em outras escolas, a gente só faz aqui. A gente espera o ano todo para saber o enredo e para poder fazer o samba. A gente está muito feliz com a parceria como um todo. É uma conquista que a gente conseguiu com muito trabalho e dedicação, porque a gente ama o carnaval e a gente fica feliz em saber que a gente conseguiu construir um samba que está na elite do carnaval de São Paulo. É uma vitória muito grande pra nós, porque eu sou corinthiano e vou morrer corinthiano. A felicidade é muito grande dentro do nosso coração”, finalizou.