As rainhas de bateria da Unidos de Padre Miguel, Andressa Marinho, da Beija-Flor, Lorena Raíssa, Imperatriz, Maria Mariá, e do Tuiuti, Mayara Lima estiveram na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) para falarem sobre suas trajetórias no carnaval, a rotina de rainha e representatividade no evento “II Seminário Sambavivências – Samba, história e educação”, realizado na noite da última quarta-feira. A mesa de debate é do projeto de extensão Sambavivências, um coletivo de alunos da graduação de História, do Campus Maracanã da universidade. Durante a roda de conversa, elas falaram sobre a importância das suas respectivas escolas do coração e o significado de representar as meninas das comunidades. Atualmente, das 12 rainhas do Grupo Especial, seis são escolhidas a partir da ala das passistas das agremiações. Além das quatro que participaram do evento, Bianca Monteiro, da Portela, e Evelyn Bastos, da Mangueira, completam o grupo.

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Fotos: Matheus Vinícius/CARNAVALESCO

Andressa Marinho, que estreia esse ano no cargo de rainha de bateria da UPM, mesmo ano em que a escola chega ao Grupo Especial (no modelo da Liesa), conta sobre o acolhimento da vermelho e branco da Vila Vintém. “Eu sou da UPM desde os 7 anos de idade. A UPM se tornou para mim um refúgio e é até hoje. Já passei por vários momentos e fases diferentes da vida – tive depressão, paralisia facial, tive um filho – e, em nenhuma dessas fases, eu me distanciei da minha escola”, disse Andressa.

A rainha comentou como o concurso da Corte do Carnaval impulsionou sua visibilidade na quadra da UPM e que foi chamada para receber a coroa durante uma visita da Imperatriz à sua escola. “Eu consegui o cargo de Musa da Comunidade logo após o concurso, e eu não esperava. Desfilei como Musa da Comunidade na frente da ala das passistas. No mesmo ano, alguns meses depois, na segunda feijoada da escola, convidamos a Imperatriz; Maria Mariá estava presente. E nessa feijoada foi meu anúncio como Rainha de Bateria em gratidão pelo que eu fiz pela escola. Acho que foi reconhecido por todo público. Se não fosse a força do público pedindo para eu ser rainha, nada disso teria acontecido. Esse desejo do povo da Vila Vintém foi o que me ajudou bastante nessa trajetória”, revelou a rainha do Boi Vermelho.

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A rainha da Imperatriz, Maria Mariá, também falou sobre a sensação de desfilar pela primeira vez, ser campeã do carnaval em sua estreia e o impacto disso na comunidade. “Foi um desfile muito lindo. Eu entrei na Sapucaí chorando, saí da Sapucaí chorando. Em todos os recuos parecia que eu ia morrer, porque eu só chorava. É o lugar que eu mais choro. O pós também foi lindo! O jeito que a comunidade abraça a gente é incrível porque são pessoas que nos conhecem. Eles sabem todas as fases que passamos nas nossas vidas, eles sabem como éramos na nossa infância e adolescência. Eles conhecem nossa personalidade. A gente não precisa forçar uma relação que não existe, a gente já está ali. As pessoas nos conhecem e se reconhecem na gente. A comunidade é a base e sem a comunidade, nós somos nada”, contou Maria Mariá.

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Em seu momento de fala, Mayara Lima se emocionou ao falar sobre seguir no Tuiuti depois de ter feito parte da ala das passistas do Salgueiro por nove anos. É na quadra da azul e dourado que ela se sentiu mais livre. “Eu fui muito feliz no Salgueiro, mas o Tuiuti foi a escola que me abriu as portas e falou ‘seja livre e faça o seu!’. Eu até me emocionou. Foi lá que eu percebi que eu seria livre para trilhar o meu caminho, para ser quem eu realmente queria ser, que era levar minha personalidade através do meu samba para as pessoas. Em 2017, eu fui convidada para ser musa da Tuiuti. Eu aceitei sem pensar duas vezes. Em 2018, eu desfilei grávida sem saber. E depois desse carnaval eu escolhi ficar na Tuiuti de vez. É a escola que domina meu coração. Foi a escola que mais me deu oportunidade e me abraçou como família”, narrou Mayara.

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A rainha do Tuiuti também comentou sobre o vídeo que viralizou no Carnaval 2022. Na época, ela era Princesa da Bateria e mostrou sincronia com a bateria durante o ensaio da “Supersom” na Avenida. A projeção a ajudou a alcançar o cargo de Rainha de Bateria para o Carnaval 2023. “Se eu vir a pessoa que gravou esse vídeo hoje, eu não saberia reconhecer. Eu queria tanto reconhecê-la, queria agradecer, beijar as mãos e os pés quando a visse. Esse vídeo mudou a minha vida literalmente! Mudou a minha vida pessoal e profissional. Depois que esse vídeo viralizou, o presidente falou que seria impossível não me colocar como Rainha. Toda menina sonha em ser Rainha de Bateria. Eu nunca imaginei que pudesse ser rainha no Grupo Especial. Sou maravilhada por estar nesse lugar e por dividir esse cenário com meninas de comunidade. O meu desejo e de todas que estão aqui é ver esses cargos preenchidos por meninas de comunidade”, disse a Mayara Lima.

Uma das alunas da plateia perguntou à Mayara Lima sobre sua relação com o mestre Marcão, que também foi do Acadêmicos do Salgueiro. “Eu amo contar essa história da minha relação com o ,estre Marcão. Como eu falei, a primeira escola de samba que eu entrei foi o Salgueiro e o primeiro mestre de bateria que eu vi regendo foi o Marcão. Eu falei: ‘Um dia eu vou ser rainha desse cara aí’. Eu já fui no intuito de viver o samba. Quando eu fiquei sabendo que o Marcão ia para Tuiuti e eu seria a princesa da bateria, eu fiquei sem acreditar. O Marcão é um dos mestres mais renomados do carnaval. Eu falo que é melhor mestre de bateria, dá licença [risos]. Hoje, eu sou rainha de bateria do mestre Marcão. Eu fui de fã à rainha de bateria. Eu amo contar essa história, porque eu nunca imaginei que isso um dia fosse acontecer”, relatou Mayara

Lorena Raíssa, no cargo desde 2022, após vencer o concurso da Beija-Flor para suceder a rainha Raíssa de Oliveira, comentou sua história com Laíla, homenageado pelo enredo da escola para 2025, e o incentivo do “tio” para se tornar passista. “Em 2014, o tio Laíla disse ‘Lorena agora pode’, porque eu perturbei ele todos os anos desde os 3 anos para ser passista da Beija-Flor de Nilópolis. Eu falava que queria ser destaque, mas não podia ainda. 2014 foi meu primeiro ano e, em 2015, ele perguntou se eu sabia sambar. Ele me chamou no camarim, eu e meu primo, e sambei para ele. Foi aí que ele falou para eu desfilar no carro dele em que ele veio de braços abertos”, explicou Lorena Raíssa.

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A rainha comentou também sobre a final do concurso que a selecionou e sobre como foi abraçada não só pelos nilopolitanos: “A gente quer estar nesse espaço para orgulhar e mostrar quem somos. Na final, eu percebi isso. As pessoas querem, não só eu quero, ver mais pessoas da comunidade. Não tinha só pessoas da Beija-Flor ali, tinha pessoas de milhares de outras escolas querendo ver uma menina da comunidade vencer o concurso. Logo depois, veio o anúncio da Mariá. Eu comecei a gritar em sala [de casa]. A Andressa Marinho, a Dedé Marinho, foi a minha professora. E hoje eu estou representando outras meninas”

Vida de Rainha

Além de comentar sobre seus históricos e toda representatividade que o cargo de rainha de bateria simboliza para todos os segmentos da escola e amantes de carnaval, elas contaram um pouco das suas rotinas. Lorena Raíssa tem uma rotina escolar, Maria Mariá cursa Comunicação Social na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Andressa Marinho e Mayara Lima não só são professoras de dança como também são mães.

“Eu levo tudo na brincadeira mesmo. Acho que o princípio disso tudo é a Beija-Flor. Diz que eu não posso parar de estudar e que eu tenho que ir à escola. A minha responsabilidade, hoje, é estudar, permanecer estudando e fazer tudo que eu sonho fazer, fazer Medicina Veterinária. Eu gosto de me desafiar”, disse a rainha da Beija-Flor.

Maria Mariá falou da responsabilidade que ela tem enquanto universitária e liderança de projeto social no Alemão. “Eu, quando eu estou na faculdade, na UFRJ, na sala de Comunicação, tendo aula, eu estou tendo aula por mim e por toda minha comunidade. Estou aprendendo por eles também. Quando eu estou aqui [na Uerj], nesse espaço, ocupando, ainda mais falando sobre samba, falando sobre o que a gente representa. Até quando a gente está ali toda banhada de brilho, maquiagem, a gente está passando uma mensagem, transmitindo o que a gente quer. Esse estereótipo é criado por pessoas brancas. Quando a gente está nesses lugares a gente representa todo mundo além de nós. Entender isso é a chave. Minha vida inteira é separada e setorizada para dar certo. É necessário estar disponível, não chegar atrasada, é se comprometer com o lugar que a gente está. Meu Projeto Legado acabou a obra agora, nosso espaço físico. Eu sou do social. Eu comecei a fazer taekwondo em projeto social, fiz pré-vestibular social, faço uma faculdade pública federal, graças a todos que pensaram. Não tem como eu não devolver o que eu recebi de alguma maneira. A gente vive nesse corre”, relatou a rainha da verde e branco.

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Andressa Marinho e Mayara Lima comentaram sobre a jornada de ser mãe e rainha e a importância da rede de apoio familiar para fazer funcionar a rotina. “A rotina, especificamente, a minha, é difícil, complicada e estressante e a minha sorte é ter a minha família comigo. Eu tenho uma rede de apoio muito forte, muito estruturada. Eu comecei a fazer dança desde os 5, 6 anos e desde sempre meus pais me apoiaram. O primeiro baque que eu levei de compromisso com o carnaval e minha vida pessoal, foi quando eu tive filho. Na minha cabeça eu quis desistir. Bateu desespero em mim, porque sou samba, carnaval, arte. Eu senti que perdi minha liberdade. O que me segurou, botou meus pés no chão e acalmou minha cabeça foi meu pai e minha mãe. Quando eu virei rainha, nada mais justo do que ser a minha família a estar do meu lado, A rotina é uma loucura. Você passa a ter muito mais compromissos, responsabilidades e preocupações. E ter filho é mais uma preocupação. A gente tem que se dividir e multiplicar em várias. Para mim não foi diferente. Na minha cabeça eu divido. Eu tenho que ter um momento com meu filho. Tenho uma parte da semana que eu sou só a Andressa-Mãe-do-Noah. Eu ainda não consegui dividir e compartilhar todos os meus compromissos. Eu acabo me cobrando muito se eu consigo me doar 100% em todos os meus compromissos. Com ajuda, com fé, com axé, a gente chega lá”, descreveu Andressa.

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A rainha Mayara complementou a fala da rainha da UPM. “A base de tudo é minha rede de apoio. Eu moro em São Cristóvão e minha mãe na Cidade de Deus. Para tudo que eu vou fazer eu preciso me organizar dois ou três dias antes, para minha mãe poder vir ficar com meu filho. Eu engravidei, meu filho nasceu, começou a pandemia. Quando a pandemia passou, eu tive que correr. Foi que eu comecei a sentir como era ficar distante do meu filho. E eu comecei a planejar como eu iria fazer para ficar distante do meu filho, trabalhar. Eu só consegui isso tudo por causa da família. A gente que é do carnaval é muito família. Se a gente não tem família, a gente não consegue fazer nada. É a nossa obrigação. A gente quis tanto ser rainha de bateria, que é o mínimo ir a todos os compromissos, chegar no horário certo. Se doar”, informou Mayara Lima.

As rainhas de bateria fecharam a série de mesas de conversa que aconteceram esta semana durante o II Seminário Sambavivências. O projeto de extensão começou a ser desenvolvido em 2023 por graduandos de História e se debruça sobre a intersecção entre História, Samba e Educação.