O enredo da Estrela do Terceiro Milênio para o carnaval 2025 rapidamente ganhou notoriedade não apenas no carnaval paulistano, mas em toda a sociedade. Intitulado Muito Além do Arco-Íris – Tire o Preconceito do Caminho Que Nós Vamos Passar Com o Amor” e desenvolvido pelo carnavalesco Murilo Lobo, o desfile defenderá os direitos e a liberdade de expressão da comunidade LGBTQIA+. Mas… como a própria comunidade do Grajaú recebeu a temática? O CARNAVALESCO buscou integrantes da agremiação e verificou o quanto os componentes estão animados para a apresentação da escola de samba.
* Seja o primeiro a saber as notícias do carnaval! Clique aqui e siga o CARNAVALESCO no WhatsApp
Unanimidade
Absolutamente todos os ouvidos pela reportagem aprovaram a escolha do tema. Entrevistados ainda fora da quadra da Estrela do Terceiro Milênio, no Calcadão da rua José Antonio Cerdeira, dois componentes da agremiação mostraram animação ao falar da temática. Carla Maria Buzatto foi a primeira: “Defender a questão LGBTQIA+ é fantástico! Acredito que escolheram muito bem o enredo”, enfatizou. Ildo Pereira, que estava conversando com ela, concordou: “Em relação ao tema, acho que é muito importante porque é a primeira escola que está defendendo a causa e isso é muito importante. Estamos dando muita liberdade para as pessoas chegarem aqui na escola”, destacou.
Quato integrantes da ala de passistas da escola também gostaram do enredo. Luiz Felipe foi o primeiro a falar: “Gostei muito do enredo, achei interessante a iniciativa da escola de falar da população LGBTQIA+ tendo em vista o quão vulnerável é essa população, quantos ataques eles sofrem por não serem aceitos. Acho que foi muito corajoso e espero que seja muito bem aceita pelo público”, comentou. Gustavo Almeida fez coro: “Gostei demais! Sendo bissexual, me identifiquei demais. Esse enredo veio na melhor hora para a Milênio, não poderia ser diferente. Acho que vamos vir com tudo nesse ano”, destacou, já falando com conhecimento de causa.
Danilo Santos aproveitou para falar, também, sobre a disputa que aconteceria naquela tarde: “Achei muito corajoso! É um tema muito importante e significativo para uma minoria, tem que ter muita coragem para falar sobre. A Milênio, pelos sambas que estão concorrendo na final, está muito bem representada: os pontos citados mexem muito com a gente, independentemente do samba vencedor. Acho que a escola estará muito bem representada”, agradeceu. Por fim, Gracielle Jesus relembrou o próprio título do enredo: “É como fala o enredo: é muito além do arco-íris. Esse tema vai representar não só a nossa escola, mas toda a sociedade LGBTQIA+. Fico muito feliz Em estar participando da escola e representado toda a comunidade. É um enredo que traz respeito, liberdade de expressão e amor. Todos nós temos o direito de amar e ser amado independente de qualquer dogma”, disse.
Duas componentes da ala das baianas também falaram a respeito, de maneira sucinta. Renata dos Santos Farias começou: “Eu gostei muito! Acho importante abordarmos esse tema para que a gente tenha um pouco mais de respeito e empatia com os demais”, comentou. Erica Martins foi outra pessoa a falar já pensando no enredo: “Acho que a nossa escola acertou no tema, o enredo vai vir super lindo e acredito que vai ser muito impactante na avenida”, imaginou.
Flagrantes
Quando interpelados, muitos enrevistados destacaram que já presenciaram e/ou tiveram ciênciade algum caso de homofobia. Carla Maria foi uma delas: “Eu vi um caso, há algum tempo atrás. Eu trabalhava na Paulista e dois rapazes que formavam um casal se cumprimentaram com um beijo na saída do metrô. Outras três pessoas vieram e agrediram os dois. Isso para mim, foi o fim. Primeiro porque não podemos julgar, temos que respeitar a escolha de cada um. Para mim, foi algo muito chocante e muito triste de se ver”, relembrou.
Luiz Felipe revelou já ter sido vítima: “Eu estava em um festa dançando, como sempre danço, e uns caras que estavam atrás de mim pegaram e começaram a me xingar, falaram que iam me bater, me levaram para um canto para discutir comigo. Chegou mais gente e me afastaram dele, me defenderam nessa hora. Fiquei muito assustado nesse dia”, entristeceu-se. Gustavo Almeida teve caso semelhante: “Já tive muitos olhares andando com colegas, amigos ou paqueras. Olhares tortos, comentários… com o tempo, vamos aprendendo a lidar. Ainda sim, é algo desconfortável que a gente vive”, comentou.
Erica fez coro aos passistas. “Eu já presenciei situações de preconceito, sim. Tenho amigos que já passaram por situações bem complicadas. É algo muito triste não só para a sociedade, mas para a pessoa em si. Acredito, porém, que está mudando. A ideia de colocar na TV e no rádio mais assuntos sobre a comunidade LGBTQIA+ eu acho muito importante”, pontuou.
Contraponto
Dois dos entrevistados, entretanto, destacaram que nunca presenciaram casos de homofobia. Cada um deles, entretanto, revelou ter vivências distintas em relação ao tema. Renata mostrou-se informada: “A minha vista, não. Mas vemos todos os dias, no noticiário, casos que são horríveis de se ver. A gente fica se perguntando o motivo de tanta maldade e de tanto ódio sem fundamento. Presenciar eu nunca vi, mas me pergunto todos os dias e fico horrorizada em ver todas essas situações”, destacou.
Já Ildo buscou ser sensato: “Da minha parte, nunca vi casos de preconceito. Se eu tivesse visto, iria chegar e conversar para ter um diálogo, mas nunca presenciai algo assim”, chocou.
Importância
Alguns dos entrevistados tiveram um viés bastante otimista em relação ao enredo. Carla Maria foi uma delas: “Tenho certeza que esse enredo pode ajudar no combate à homofobia. As pessoas precisam ver que o respeito é mútuo. Todos precisam respeitar as diferenças. Estamos em 2024, partindo para 2025. Não podemos mais aceitar certas coisas! O mundo evoluiu! Não podemos aceitar porque somos iguais, independentemente da opção sexual da pessoa”, empolgou-se.
Ildo foi além. Na visão dele, o desfile é uma chamada para que a sociedade inteira se conscientize: “A Milênio está dando a oportunidade de abrir o leque – como diz um dos sambas finalistas. A gente está dando a oportunidade para todo mundo, algo que não aconteceu no carnaval até aqui. Queremos que todo mundo fique à vontade para repensar”, refletiu.
Visão crítica
Outros componentes, entretanto, foram mais céticos em relação à influência do desfile na sociedade. Gracielle foi uma delas: “Eu não acredito que o preconceito suma, isso vem de cada um e o respeito vem de dentro da gente. Mas acredito que o tema vai trazer visibilidade para a sociedade LGBTQIA+. Vamos ser mais vistos e respeitados. Acho que é um tema muito bom porque a gente existe e tem o direito de expressar nossos sentimentos. Nós estamos aqui”, vociferou.
Renata, um pouco mais otimista, também falou forte: “Acho que nós estamos no caminho certo. Sinceramente, não acredite que o preconceito acabe cem por cento. É uma forma de chamar a atenção da população em si para que a gente possa dar mais apoio à população LGBTIQA+, que o pessoal tende a ficar de fora. Afinal de contas, estamos todos na mesma sociedade e não tem por quê excluir alguém por questão de escolha sexual. Temos que respeitar, simplesmente. O respeito está acima de qualquer coisa, é o caminho para onde devemos ir”, destacou.
Erica foi pelo mesmo caminho: “Esse tema está sendo muito importante, mas acho que o preconceito não vai necessariamente acabar, mas acho que a mente de quem ver o desfile vai ficar um pouco mais aberta, acho que o desfile será impactante. Acho que o preconceito pode diminuir um pouco, e isso é importante”. disse.
O último a falar, Danilo, aproveitou para desabafar: “Mesmo achando esse tema muito importante, ele não vai acabar com o preconeito, infelizmente. O preconceito vem de anos e está mais na questão da educação: a sociedade deveria estar educando quem está vindo e reeducando quem já está aí. Infelizmente, acabar não vai. Temos que lutar por um mundo melhor, para que a gente seja respeitado, passe na rua e não passe por humilhações, para que a gente não seja xingado ou discriminado, para que olhem para a gente com respeito, não olhem com olho torto, de nojo, de inveja ou de raiva. Para que a gente possa sair na rua e mostrar quem somos, o que queremos, sem ninguém apontar o dedo para a gente, sem ter medo de apanhar ou tomar um tiro. Essa, infelizmente, é a nossa realidade. Espero que, com esse tema, todo mundo aprenda e passe a respeitar. Se não quiser amar, não ame; mas que respeite”, finalizou.