A Portela completou 100 anos e tem muito o que comemorar. Primeiro, porque é uma instituição que “sobreviveu” a devastação cultural que todo setor passa, teve momentos complicados, mas segue viva, forte e ainda gerando muitos frutos. Segundo, ela formou muitos e muitos sambistas para o mundo. Quantos foram “concebidos” na Majestade do Samba? Diversos. Terceiro, porque em seu papel de escola de samba forneceu educação e lazer para diversas pessoas, que não conseguem ter acesso em outros espaços da sociedade.

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Foto: Nelson Malfacini/Site CARNAVALESCO

Porém, o ano do centenário não foi fácil para o portelense na pista da Marquês de Sapucaí. O desfile, infelizmente, foi traumático. O sonho de uma apresentação inesquecível foi por água abaixo. Agora, com enredo definido para 2024, novos carnavalescos, reforços para direção de carnaval e para harmonia, nova porta-bandeira, sem dúvida, o sonho do portelense é pisar novamente na Avenida e esquecer o que houve em 2023.

É verdade que os problemas em um desfile podem/devem gerar soluções para o outro. Dificuldades financeiras são sempre citadas, principalmente, em uma escola que não tem um patrono para segurar quando o calo aperta. Do lado de fora, todo mundo tem uma solução. Dentro, a coisa é sempre mais difícil.

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Foto: Nelson Malfacini/Site CARNAVALESCO

Eleito para mudar a Portela, o grupo “Verdade” foi fundamental na volta do protagonismo portelense no Grupo Especial. Após gestões desatrosas, a Águia Redentora devolveu o patamar de desfile vencedor. Através de Marcos Falcon e depois de Luis Carlos Magalhães, o torcedor voltou a sonhar com título e chegou ao topo no ano de 2017.

Os últimos desfiles, principalmente, 2020, 2022 e 2023 foram muito aquém do que a gestão vinha produzindo na Portela. Como uma agremiação que não possui verba “infinita”, como acitado acima, a Azul e Branco de Oswaldo Cruz e Madureira necessita ter uma gestão impecável dos recursos para que proporcionem a condição do trabalho no barracão fluir de maneira adequada na elaboração de fantasias e alegorias. As penhoras, vindas de dívidas de gestões anteriores, também massacram os cofres.

Caso a gestão não funcione de forma impecável, o que não é fácil ser obtido, ano após ano, o desfile acaba sofrendo e o resultado é sempre complicado na quarta-feira de cinzas. Por exemplo, do lado de fora, posso estar errado, mas sinto que a Portela conta com “muito falatório” em disputa de samba-enredo, o que acho sempre prejudicial, afinal, quem vota, geralmente, não está totalmente por dentro do enredo, não possui o conhecimento musical, ou ainda pior, infelizmente, pode julgar por amizade. A disputa gera trauma e que acaba não refletindo no julgamento, mas abala o noticiário do pré-carnaval. Totalmente desnecessário.

Passando pelo desfile de 2023, confesso que antes da apresentação já esperava grande dificuldade para escola brigar pelo sábado das campeãs. O título achava praticamente impossível. Veio a arrancada da escola. Senti algo que não sei explicar até agora, vendo tudo passar na minha frente, comecei a acreditar que a Portela surpreenderia. Durou pouco. Logo recebi a informação dos problemas na pista, principalmente, da alegoria colidindo com a frisa e o buraco, e, dali para frente, todo mundo sabe que desandou. Em nenhum momento, acreditei em rebaixamento. A escola tinha quesitos fortes, como Harmonia, Enredo, Bateria e por aí vai. O próprio casal de mestre-sala e porta-bandeira tinha certeza que ponturia bem pela qualidade da apresentação da dupla.

O tempo passou e os portelenses depositam suas fichas na dupla André Rodrigues e Antônio Gonzaga. Talento, eles possuem e muito. Dialogam com o moderno e valorizam os fundamentos tradicionais. Lançaram o enredo que inicialmente saiu muito bem na crítica especializada, embora, apenas na pista será possível comprovar sua eficiência. Agora, o que o torcedor quer saber é se a dupla terá condição de realizar tudo o que vai projetar nas fantasias e alegorias.

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Foto: Divulgação/Portela

Em uma disputa cada vez mais alta no Grupo Especial é fundamental sair na frente. A primeira verba financeira (TV Globo) cai nas contas das escolas de samba em julho. Assim, quem já compra material consegue produtos especiais, e, principalmente, com valores mais favoráveis. Acredito que neste ponto, como André Rodrigues já fez carnavais em São Paulo, ele saberá sair na frente, já que a cidade tem “nichos” especiais de materiais para alegorias e fantasias.

Em quesitos técnicos, a Portela voa em um céu de brigadeiro. Ninguém falou, mas o intérprete Gilsinho foi muito sondado para outras agremiações pós-desfile de 2023. Ficou! É patrimônio. Merece e muito ser cada vez mais valorizado pela diretoria e torcedores. A “Tabajara do Samba” também merece muitos e muitos elogios. Segura a onda o tempo inteiro. Mantém o nível de qualidade lá no alto. Mestre Nilo Sérgio, seus ritmistas e Gilsinho com a equipe do carro de som formam um conjunto musical de alto gabarito.

Sempre quesitonado, o quesito Comissão de Frente da Portela não é mais o calcanhar de aquiles. Os coreógrafos Leo Senna e Kelly Siqueira enfrentaram pressão, mataram no peito os desafios, superaram e ganharam muito crédito para o desfile de 2024.

O quesito de Mestre-sala e Porta-bandeira, na minha visão, estava consolidado na Portela. Sem viver a parte interna da escola, eu não mexeria em nada. Agora, é inegável que a opção pela entrada de Squel mantém a qualidade e gera expectativa imensa para apresentação com Marlon. A primeira exibição oficial da dupla na quadra já arrancou aplausos portelenses. Na roda da vida, os ciclos acontecem e a direção optou por novos tempos.

Considero que o maior desafio da Portela no Carnaval 2024, de acordo modelo atual do Grupo Especial do Rio de Janeiro, é ter a gestão focada em finalizar todos os processos de elaboração do desfile com o projeto estipulado indo na íntegra (ou quase) para Sapucaí e não passando por nenhum problema grave na pista, se colocar como postulante ao título ou o que parece ser mais viável que é a vaga no sábado das campeãs.